sábado, 21 de fevereiro de 2009

A mina de Cana Brava em Minaçu está mais para purgatório do que para paraíso terrestre...

Em resposta a artigos publicados recentemente no DM:

Aos convidados para irem conhecer a mina de Cana Brava em Minaçu, eu aconselharia cautela. Não é local de turismo e muito menos um ambiente saudável para quem busca ar puro e descontaminado para encher os pulmões. Dar uma fungada mais profunda, nem pensar!
Os relatos de quem desbravou a bela Serra da Cana Brava - esta sim um paraíso ecológico, se não tivesse as imensas crateras que a voraz produção mineral cravou naquele santuário, são desalentadores. São centenas de famílias atingidas pela poeira devastadora do mineral cancerígeno que causa, entre outras doenças, o pulmão de pedra ou pulmão branco - asbestose, além do câncer de pulmão e o temível mesotelioma.
O que impera naquela região, que foi considerada o Eldorado goiano, é a lei da mordaça ou um silêncio obsequioso imposto pelos detentores do poder - os caciques da cidade. E aí se incluem políticos, donos dos meios de comunicação, sindicalistas, comerciantes. Um pacto de silêncio vergonhoso para que não se conheça a triste realidade com a qual convivem as famílias atingidas pela catástrofe sanitária do século XX.
O convite para que visitem a mina a qualquer hora e dia sem avisar é uma falácia. A tal política das "portas abertas" é algo que só funciona quando os convidados são leigos. Se houver alguém na "comitiva" que entenda minimamente de saúde e meio ambiente, aí começa um drama. Não deixam entrar antes de passarem a noite lavando e lustrando as instalações e modificando o ambiente para o "ilustre visitante".
Eu estive em três oportunidades na mina de Cana Brava, na SAMA em Minaçu. Estive em 3 décadas distintas (80, 90 e agora em pleno terceiro milênio) e pude constatar o avanço da frente de lavra sobre terras agricultáveis já a começar pelo sobrevôo que a cada visita me deixa mais impressionada. O que acontecerá quando o minério se esgotar ? Quem vai tomar conta daquelas crateras? É uma chaga aberta em plena serra e ninguém discute sobre isto.
As vociferações que tentam desqualificar o nosso trabalho por chamar a atenção das autoridades e alertar sobre o que está acontecendo em Minaçu não nos incomoda, muito menos as ameaças veladas e denúncias que institutos propagandistas da fibra cancerígena tentam nos imputar. O que nos preocupa é a falta de conhecimento da população de Goiás sobre o que acontece em Minaçu, manipulada pela desinformação promovida por defensores da fibra assassina, que se locupletam em suas campanhas políticas com fartas doações em dinheiro. Basta entrar em sites como o Transparência Brasil para saber quem é que é financiado pela mineradora e indústrias do amianto neste país da "IM(p)UNIDADE PARLAMENTAR".
Tentar ridicularizar os atos de importantes homens públicos do país, como fizeram com a matéria assinada no jornal DM, sobre a Portaria 43 do Ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, é mais uma das especialidades destes lobistas que pensam que podem iludir o povo com seu jogo de palavras, que incluem ofensas pessoais àqueles que divergem de sua opinião autoritária. O povo não é idiota e sabe muito bem o que está por trás destes ataques travestidos da defesa do interesse do povo de Minaçu. Só adiam o debate, que tem de ocorrer e rápido, antes que seja tarde demais.
O que estes farsantes não dizem, por exemplo, é que o "especialista" que diagnostica os pulmões das pobres vítimas de Minaçu tem residência médica em ginecologia (a nós parece que o buraco que ele investiga é mais embaixo do que deveria!). Cânceres em Minaçu, nem pensar! "Todos são inveterados fumantes", é o que dizem, mesmo que nunca tenha posto um cigarro na boca. Ouvi este relato repetido à exaustão nos encontros em Minaçu com vítimas, viúvas e familiares ávidos para contarem seus dramas pessoais e o descaso em que vivem. Doentes só são reconhecidos e indenizados se tiveram exposição antes de 1980, pois faz parte da máquina propagandística que quem trabalhou após a década de 80 não ficará doente.
Os amiantófilos nunca dizem que quem se expôs a partir de 1980 só terá câncer a partir de 2010.
Afirmar a inexistência de doentes em Minaçu é, no mínimo, uma indecência e um insulto à inteligência humana. Não vivemos mais a época do regime militar onde falar a verdade podia conduzir a morte! As mordaças se romperão e aí veremos quem é que ilude o povo de Minaçu com falsas promessas.
Falam em guerra comercial, como se os produtores de amianto não fizessem parte desta disputa feroz. Por estupidez e visão míope, defendem uma tecnologia obsoleta como é o cimento-amianto, que vem sendo progressivamente substituído por materiais muito mais versáteis (haja vista as caixas d’ água que ninguém mais quer com amianto). Certamente novos concorrentes virão, já que a indústria da reciclagem está sendo uma importante opção para aqueles que querem um material ambientalmente correto e menos perigoso que o amianto!
Esperamos que o amianto seja substituído o mais rapidamente possível e que os políticos de Goiás olhem para Minaçu em busca de alternativas saudáveis e sustentáveis para impulsionar o desenvolvimento da região, ao invés de ficarem enganando a população de lá com promessas mirabolantes de que vão impedir que o amianto seja banido no Brasil.
Esperamos, sinceramente, que Minaçu deixe de ser a cidade das viúvas do amianto e purgatório das vítimas, saindo da era das trevas e se libertando deste pacto de silêncio imposto, com o fim daquele que já foi considerado o mineral mágico e posteriormente se converteu num pesadelo para a sociedade industrial do século XX.


Fernanda Giannasi é Engenheira Civil e Auditora-Fiscal do Ministério do Trabalho e Emprego em São Paulo há 25 anos, onde é Gerente do Projeto Estadual do Amianto.

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