terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Goiânia: o lixo, o parlamento e a prefeitura

* Publicado no jornal "Diário da Manhã" em 07.12.09

A Prefeitura de Goiânia, ao intensificar o processo de organização do trabalho de coleta seletiva, nada mais faz do que o esperado, o almejado, o já iniciado, desde 2000, quando no Brasil inteiro se intensificou a questão da consciência e da sustentabilidade ambiental.

Em várias cidades brasileiras existem bons resultados a partir da associação de pessoas coletoras de recicláveis, propiciando a inclusão social de populações marginalizadas, em espaços e condições de trabalho mais adequados e melhores condições de comercialização.

O exercício da cidadania neste processo substitui as condições de violência e de marginalidade vividas nas ruas; o trabalho organizado se torna profissional e agrega mais resultados positivos, desde a questão da quantidade e da qualidade do material coletado à questão do desenvolvimento econômico e socioambiental sustentáveis.

Não é possível ao alcance curto da inteligência que remete à assistência social as causas dos dilemas sociais e econômicos de nossa população, o entendimento de que as causas estão na concentração de renda, na falta de ideais autenticamente coletivos e na falta de vocação política na exata acepção da palavra, o que tem levado esta classe a perpetrar palavras e atitudes torpes, como o nepotismo, a corrupção, a defesa de 13º, 14º e 15º salários.

Mas é possível desejarmos sucesso a este empreendimento que se reinicia, de organização da coleta seletiva, enquanto cidadãos do bem. É necessário.

E este reinício poderia ter sido menos traumático se nosso parlamento não tivesse deixado ao vento o trabalho começado em 2000, se tivesse cobrado a continuidade dos bons projetos e serviços, já que muitos parlamentares têm mandatos contínuos.

Associações podem oferecer serviços sociais como de orientações jurídicas, de saúde, educação, segurança alimentar, esporte e lazer, oferecer banheiros para que os trabalhadores tomem banho ao final do dia, roupas adequadas.

Quem não se comove com um carrinho cheio de lixo sendo puxado por semelhante visivelmente maltratado e quase sempre com alguma criança dentro ou por perto ajudando na coleta? Isso não é digno, e o que vivem estas pessoas fora destes momentos também não. Mas tirar proveito disso é menos digno ainda.

Coletores de lixo ajudam a reduzir custos e a preservar o ambiente. Precisam ter reconhecida sua atividade, como sendo profissional e altamente relevante ao todo da sociedade. Segundo levantamentos da Comurg, cerca de 35% das mais de 30 mil toneladas mensais de lixo poderiam ser reciclados, gerando, em média, R$ 800 mil e aumentando a vida útil dos aterros sanitários.

Nosso parlamento precisa desenvolver uma ampla campanha de sensibilização para a mudança dos hábitos de descarte nas atividades funcionais e domésticas, de consumo exagerado, de desperdício, e atuar mais próximo da sociedade em geral, conhecendo a realidade, para transformá-la, para formular discursos, leis e ações que realmente emancipem as pessoas e melhorem a qualidade de vida na cidade.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Não basta se indignar. Vote domingo, para o Conselho Tutelar!

* Publicado no jornal "Diário da Manhã" em 28.11.09

Historicamente no Brasil, a problemática de crianças e adolescentes vem sendo percebida sob o viés de situações pontuais, tratadas de modo desconectado da trama de relações que perpassam o cenário no qual estão inseridos.
O capitalismo e o conseqüente enfraquecimento da sociedade salarial diante da precarização do trabalho e da vida, se traduzem em uma sociedade fragmentada e acéfala, de relações cada vez mais superficiais e descartáveis.
A questão social no Brasil não se resolverá através de políticas sociais, simplesmente. É preciso que alteremos ainda mais as correlações de forças, as condições estruturais da sociedade.
E isto, espero, só através do voto. Do mais particular, ao mais geral. Nas discussões de casa, do condomínio, da comunidade, do trabalho, da cidade, do Estado, do país.
Cada vez mais, no Estado democrático, é necessário desenvolvermos nossa capacidade de reflexão e teorização, de percepção de contradições, de relações entre causa e efeito. Disto depende nossa reação aos acontecimentos do mundo que nos cerca.
As situações de violência e exploração que envolvem crianças e adolescentes, provocam sempre grande comoção: drogaditos, jovens e crianças que assaltam, que são estupradas, maltratadas; jovens e crianças que matam e que morrem nas ruas e nas famílias.
Precisamos ir além da comoção. Precisamos refletir, agir. Exigir.
Domingo, dia 29 de novembro, em Goiânia, vote para o Conselho Tutelar dos Direitos de Crianças e Adolescentes.
Se sua pessoa ou pessoa amiga precisar, em última instância, de justiça em situação que envolva filho (a), sobrinho (a), vizinho (a), parente ou conhecido (a) com menos de dezoito anos, pode precisar do Conselho Tutelar.
O Conselho Tutelar atua no encaminhamento de situações que envolvem o direito de crianças e adolescentes. É um órgão administrativo, vinculado ao Poder Executivo Municipal com efeito operacional, de caráter autônomo e permanente, para fiscalização da efetivação das ações previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
Daí, ter um papel eminentemente político.
Os conselheiros tutelares são porta-voz de suas comunidades e atuam como mediadores junto a órgãos e entidades relacionadas aos direitos de crianças e adolescentes. São eleitos 5 membros por região, através do voto direto da comunidade, com mandato de 3 anos.
Conselheiros devem ter liderança, representatividade, poder de formar opinião junto à sociedade e ao poder público, no que diz respeito à visão e ao trato de crianças e adolescentes, no sentido de garantir que a família, o Estado e a sociedade cumpram seus deveres.
Conselheiros não têm o papel de educar, embora sejam naturalmente, educadores; não vão oferecer cestas básicas, remédios, terapias, emprego, segurança, moradia. Devem mobilizar e articular serviços, programas e profissionais competentes para a defesa dos direitos de crianças e adolescentes em sua luta diária, construindo persistentemente, uma sociedade justa.
A sociedade deve eleger para o Conselho Tutelar, candidatos que têm história de trabalho na luta pela proteção integral dos direitos de crianças e adolescentes.
Quem vota revela responsabilidade e compromisso com a luta pela defesa dos direitos de crianças e adolescentes.
Cumpra o seu papel.

domingo, 22 de novembro de 2009

Viva a Consciência Negra!

* Publicado no Jornal "Diário da Manhã" em 17.11.09

“... 75% da sociedade também é preta...”
Libera O Badaró

Na cidade Utopia, o trabalho físico tem, não menor importância, mas menor desgaste. As pessoas dedicam-se plenamente à elevação moral, intelectual, espiritual. Buscam prazeres menos efêmeros do que os que nos trouxe a sociedade capitalista. Lá, os cidadãos têm igual acesso aos serviços de educação e saúde. Não têm problemas de moradia e os índices de violência são baixíssimos, mais devido à qualidade de vida, do que ao sistema carcerário que é extremamente duro e eficaz.
Lembrando que utopia não é o irrealizável, como disse Paulo Freire, mas o ainda não realizado, o mercado goianiense precisa se modernizar e o Estado precisa desconcentrar a renda e estimular o que significa aumentar a atratividade das cidades para o turismo e nada melhor, neste sentido, do que garantir a qualidade de vida.
Existem estudos que mostram que neste século a indústria que mais vai crescer é a do turismo, do lazer e do entretenimento. Pergunta-se para quem, se a maioria dos brasileiros não pode freqüentar festas, cinemas, teatros, viajar, conhecer a diversidade no mundo das artes plásticas, da música, da literatura.
Feriados na cidade podem significar circuitos culturais, esportivos, de artes, de lazer etc. Podem significar postos de trabalho extra.
Não há excesso de feriado diante do tamanho dos salários. Diante do desgaste diário do trabalhador brasileiro (valor da cesta básica x salário, trânsito, longas distâncias, convívio com humores e personalidades diversas, debilidade das relações sociais, pessoais e familiares), quando o feriado chega, é hora de colocar em dia as relações, os cuidados com o corpo, a casa, o jardim e o carro, o sono, o lazer, o esporte, a caridade, a espiritualidade.
Os feriados são garantia de sobrevivência para trabalhadores. Chegam sempre na hora exata. Estudiosos garantem que não há maior produtividade com corte de férias.
Se por um lado, o Brasil possui o maior número de dias livres de trabalho, em número de horas trabalhadas supera os países da Europa.
O Brasil empata com a Lituânia, com 41 dias de folgas, segundo pesquisa da consultoria Mercer. A França está na segunda colocação ao lado da Finlândia. A Espanha tem um total de 36 dias.
Os trabalhadores com menos dias de folga são os canadenses, com 19. Na China, são 21. No Japão são 20 dias de férias por ano, mais 16 dias de feriados, o que o faz o país com o maior número de feriados. Nos Estados Unidos não há lei que define, mas normalmente são 15 dias de férias e 10 dias de feriados.
O Brasil tem o maior número em dias de férias trabalhistas: 30, igual à França e à Finlândia. No critério de feriados, o País está na sexta posição, com 11 dias.
É a soma dos critérios férias e feriados que coloca o Brasil no topo da lista.
A Europa é a região do mundo onde menos se trabalha por ano e a Ásia onde se possui menos dias de descanso. Na Índia, são apenas 12 dias, na China 10 e 14 em Cingapura.
Vale avaliar que salários e benefícios em vários países, são melhores que os brasileiros. A Noruega oferece licença paternidade de dois meses e as mães desfrutam de 12 meses de salário maternidade, sem trabalho. A Suíça garante licença de três dias pela morte de parente.
Nos últimos dez anos os americanos trabalharam 137 horas a mais do que os japoneses, 260 horas a mais do que os trabalhadores ingleses e 499 a mais do que os alemães.
Muitas constitucionalidades precisam ser vistas, é fato, mas o motim que derrubou o feriado do Dia da Consciência Negra está equivocado.
O Movimento Negro é legítimo e não reconhece o “Dia da Abolição” como sendo data significativa para negros e negras, que ficaram à mercê da sociedade brasileira, desde sempre.
Oxalá os capitães do motim repensem a manobra e se dediquem a produzir mais para o imenso filão de consumidores negros e negras. Que desistam de ver seus marinheiros vibrarem rijos, os chicotes, para verem o povo negro a dançar “ao som de orquestras irônicas e estridentes”, relembrando os dos conhecidos navios negreiros de outrora.

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

“Não me amarra dinheiro não, mas elegância...”

* Publicado no jornal Diário da Manhã de 03 de novembro de 2009

“Os ideais que iluminam meu caminho,
são a bondade, a beleza e a verdade.”
Albert Einstein

Música do desfile, frase de folders e cartazes do 2º Concurso de Beleza do Bairro Novo Paraíso, realizado no dia 25 de outubro, Dia Nacional da Juventude, em Anápolis.
Após dias de muita correria, inúmeros telefonemas e articulações, conseguimos realizar o que propusemos. A Associação de Moradores, a Adrienne e eu, recebemos no Núcleo de Apoio Cristão – NACRI, da Irmã Iozita, cerca de 500 pessoas, alegres, receptivas; torcendo pelas próprias eleitas, entre as 12 meninas que se candidataram ao pleito.
Nosso obrigado à Irmã Iozita, referência por suas lutas nesta comunidade.
Músicas escolhidas e gravadas enfim, pela Ana Clara, desfile na passarela: Viva La Vida, de Coldplay, Falling Down, de Oasis, Oba, Lá Vem Ela, de Charlie Brown Jr., Dota, de Basshunter, a Burguesinha, claro, do Seu Jorge, Delirious, de David Guetta, Beleza Pura, com Skank, Watch Out, Alex Gaudino. Que festa bacana, divertida, bonita e tranqüila.
Impossível não revelar aqui, nosso sucesso. Como escreveu o Yuri Lopes, no DM, não foi apenas mais um desfile de beleza. O 2º Concurso de Beleza do Bairro Novo Paraíso foi uma oportunidade de confraternização e mobilização na comunidade do Novo Paraíso e adjacências.
Foi um desafio, o deflagrar de uma intenção maior, que é desenvolver com o poder local e o poder público, projetos socioambientais extremamente necessários a esta comunidade e ao bairro.
O Bairro Novo Paraíso se formou há 40 anos; tem uma história em Anápolis e a comunidade merecia esta festa. Contamos com o público da comunidade, que lotou o ginásio do NACRI, um espaço muito organizado. O que mais quisemos foi levar alegria e levantar a auto-estima da comunidade. Ressaltar o belo que há ali, a força, a luta, o poder local. Exercitar a idéia de que "juntos, somos fortes!". Este foi o nosso discurso.
Nossa gratidão ao Batista Custódio pelo estímulo jovial e espontâneo do apoio moral que nos dedicou quando recebeu nossa idéia, ao Yuri do Diário da Manhã, por registrar este início do nosso trabalho nesta comunidade.
Gratidão à companheirada que desde o início se comprometeu com nossa causa: ao Deputado Luis César Bueno, ao querido Donizete, ao belo e bom Cristiano, da SALON, à Ana Luisa, à Sildete, ao Marcos e demais da APROBEL, que estiveram resolutos, conosco; aos toques do Vasco, ao carinho e a atenção do Céser Donizete, da Lúcia e do Prefeito Antônio Gomide, de Anápolis, ao Prof. Augusto César, à Juliana, à Orquestra de Violeiros e à Ângela, da Secretaria de Cultura de Anápolis, ao Secretário Chico Rosa e ao Maurício, da Secretaria de Assistência Social de Anápolis, ao Ten. Péres, da CMTT, ao apoio do Dr. Josias Gonzaga, do José Alberto, do Dr. Wagner e dos amigos da Valec, à disposição em contribuir, do Paulo Taranto da CONCREMAT, do Sr. Antônio Almeida da Kélps Editora, do Vereador Pedro Mariano e de seu chefe de gabinete, camarada Marcos Aurélio, do Sr. Alexandre e Dna. Cleusa, do Carlos Past, do Max Miranda, da Tia Bélica da Belô Confecções, do Sr. Washington da Kuko, do Sr. José e sua família, da papelaria do Cond. Porto Rico, da Profª Virgínia, Sec. de Educação de Anápolis.
Como não registrar solenemente o muito obrigado a quem ligou oferecendo apoio, que foi o amigo inconteste, Sr. Wilson, da WD Construções?
Nosso obrigado pela presença do Armando da Croqui Fashion, à Dna. Jorgina da Casa das Noivas Boa Sorte, às irmãs Rosângela e Rosalina da Lanchonete Irmãs Coimbra, ao Sr. Madureira e ao Marim do CEASA, ao Sr. Rufino e Dna. Mariinha do Tempero e Sabor, à Tia Bélica, da Belô Confecções, ao Genésio, à Neide, esposa do Sr. Luiz Paulo, Presidente da Associação de Moradores e também à Dna. Nelci, ao jovem Augusto, ao Vice Presidente da Associação, ao Sr. Aristidio e aos demais que nos ajudaram nos finalmentes do dia, como o terno apoio da Madalena, da Leila, da Isadora e do Frei Marco Aurélio, da Paróquia de Santana...
Enfim, nosso muito obrigado à confiança que as candidatas e seus familiares tiveram em nós. Meninas humildes, belas jovens, sonhadoras, encantadoras pela simpleza, pela generosidade, pela ousadia de participar, de querer, de exercer poder. A vocês, meninas candidatas e seus familiares apoiadores, incentivadores, muito obrigada!
Aline, Angélica Cristine, Danielle de Carvalho, Danila de Carvalho, Danúbia Maia, Débora de Miranda, Jéssica Gonsalves, Jéssica Lorraine, Keyse Kelly, Estefany Rodrigues, Suzane Jacqueline e Thayane Priscilla, Parabéns!
A comunidade está em festa. Desafios aceitos, objetivos, por ora, alcançados. Graças a Deus.

sábado, 24 de outubro de 2009

O ProJovem Adolescente em Goiânia

* Publicado no Jornal Diário da Manhã em 22.10.09

“É necessário garantir a todos e a todas
as oportunidades para desenvolverem plenamente
suas potencialidades e capacidades e,
assim, viverem de forma digna e autônoma”.
Patrus Ananias

O PROJOVEM ADOLESCENTE – PJA faz parte do Programa Nacional de Inclusão de Jovens (ProJovem) do Governo Federal, inserido no SUAS. É um serviço sócioeducativo de proteção social básica, para garantia da convivência familiar e comunitária e ainda, da inserção, reinserção ou permanência do jovem no sistema educacional com um desenvolvimento integral e contínuo.
Atualmente, 7 milhões de brasileiros entre 18 e 24 anos não estudam nem trabalham, de acordo com a Pnad. São jovens que têm dificuldade de encontrar emprego porque não têm escolaridade mínima e não estudam porque precisam trabalhar.
Segundo a Pnad - Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios do IBGE em 2008, no Brasil existem 492 mil crianças de 10 a 14 anos que não conseguem redigir bilhetes simples.
De acordo com o canal UOL, “o brasileiro fica menos tempo na escola do que deveria. A média nacional de anos nas instituições de ensino em 2008 foi de 7,1 anos para todo o país. De acordo com o consultor em educação da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) no Brasil, Célio da Cunha, cada cidadão deveria passar, no mínimo, dez anos estudando.
"Com sete anos de estudo, uma pessoa acompanha as demandas do mundo com perda. Há um déficit", afirma Cunha. De acordo com o pesquisador, poucos anos nas instituições de ensino geram pouca cultura para as demandas do século.
O UOL também registra a fala da secretária executiva do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil, Isa Maria de Oliveira: “Quando há concorrência entre trabalho e estudo, a educação é prejudicada e passa a ser um direito negado. Com isso se dá um círculo vicioso: pessoas sem preparação para o mercado de trabalho, que vão para a informalidade, com rendimentos baixos e acabam formando famílias pobres e repetindo o ciclo da pobreza".
Ressalte-se aqui, que o Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu artigo 4º, diz que “É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária”.
Então, o PJA devolve às famílias, esta responsabilidade, o que não quer dizer que o jovem tenha perdido seu protagonismo juvenil, assim como o fato de possuir cartão de banco e receber diretamente uma bolsa, não garantiu os referidos direitos à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.
O SUAS – Sistema Único de Assistência Social, regula e organiza as ações sócio-assistenciais tendo como alvo a atenção às famílias, seus membros e indivíduos e como base o território em questão. A matricialidade sócio-familiar reconhece que a família é o eixo da vida social e necessita da proteção social do Estado diante das desigualdades sócio-econômicas, traduzidas na pobreza e na vulnerabilidade social da família em seus diferentes ciclos de vida.
As famílias beneficiárias do Programa Bolsa Família têm incluídos na transferência de renda que recebem, o valor correspondente a cada jovem com idade entre 15 e 17 anos, presente na casa. Este (a) jovem deve fazer parte, então, do coletivo do PJA mais próximo de sua residência.
O trabalho sócioeducativo do PJA persegue, junto aos jovens, o aprimoramento da “capacidade de ouvir, de se expressar, de exercitar a flexibilidade e a tolerância diante das diferenças, bem como, de mediar conflitos, negociar interesses, construir consensos, identificar interesses comuns, criar, projetar e assumir compromissos”, através de uma formação para a cidadania, que pressupõe “a sensibilização e o desenvolvimento da percepção dos jovens sobre a realidade social, econômica, cultural, ambiental e política em que estão inseridos”.
No ProJovem Adolescente, “as dinâmicas que envolvem a convivência social são foco de aprendizagem contínua que transversa todas as atividades propostas, assim como os temas transversais da educação”, e “a Formação Técnica para o Trabalho – FTG, embora não vise à qualificação profissional, é imprescindível para a socialização e o desenvolvimento de valores e habilidades que estruturam o (a) jovem para a vida em sociedade”.
Em Goiânia, é a Secretaria Municipal de Assistência Social – SEMAS, da Prefeitura Municipal, o órgão responsável pelo ProJovem Adolescente, que está presente em 11 Centros de Referência em Assistência Social e em 10 instituições conveniadas, desenvolvendo um trabalho pluridimensional, que extrapola o âmbito da condição concreta de ser humano, o que imprime ao PJA, a necessidade de que se desenvolva de forma planejada, através de parcerias com o poder público e a sociedade, integrando instâncias necessárias ao desenvolvimento pleno dos (as) jovens envolvidos neste processo.

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Vi o mundo, o amianto, o parlamento e o Goiás

* Publicado no Jornal "Diário da Manhã" em 01.10.2009

Enquanto no parlamento goiano, nem os que se colocam a favor do cerrado, pelo desenvolvimento econômico sustentável, na defesa do meio ambiente, nas lutas da classe trabalhadora ou, pela saúde como direito e parte da dignidade humana, promovem discussão sobre o banimento do amianto, o site viomundo, do jornalista Carlos Azenha publicou, em 25 de agosto, artigo com o título “Amianto: Médicos brasileiros passam a perna em canadenses”, que revela a fraude das pesquisas encomendadas ao Instituto Brasileiro do Crisotila, criado e mantido pela SAMA com a ajuda ilegal de verba pública.
O artigo conta que a médica Margaret Becklake, professora do Departamento de Epidemiologia, Bioestatística e Saúde Ocupacional da McGill University e o médico Nestor Müller, professor do Departamento de Radiologia da University of of British Columbia (UBC) foram citados como integrantes do projeto Asbesto Ambiental, do IBC, que apresenta conclusões quanto ao uso do asbesto (amianto). Os dois, não só desmentiram, aviltados, a participação neste “projeto”, como também declararam não concordar com os resultados apresentados.
O médico Nestor Müller, disse: “Eu fiquei chocado com a informação de que um projeto financiado pelo Instituto Brasileiro do Crisotila lista meu nome como um dos apoiadores internacionais. Eu asseguro a você que eu nunca nem soube que tal instituto existia. Eu não quero, de forma alguma, ser associado com um instituto que afirma em seu website que um de seus objetivos é "defender o uso controlado do amianto crisotila”. Eu sou contra o uso do amianto, porque acredito fortemente que se constitui num risco para os trabalhadores e consumidores.”
A médica Margaret Becklake enviou email à Marina Júlia de Aquino, presidente do IBC, com cópias ao viomundo e às instituições que tiveram acesso à publicação da “pesquisa”, afirmando: “Fui informada por Conceição Lemes que meu nome está vinculado com a nova pesquisa intitulada "Exposição Ambiental ao Amianto" pelo IBC (Instituto Brasileiro do Crisotila). Eu não estou envolvida com tal pesquisa e requeiro que vocês removam meu nome e o de minha universidade (McGill University) de seu material publicitário. Confirme o recebimento deste. Por favor, me informe também quando você tiver feito isto.”
“Fiquei horrorizado e escandalizado de ver tudo isso”, afirmou Colin Soskolne, professor de Epidemiologia da Escola de Saúde Pública da Universidade de Alberta, categórico ao garantir: “Do ponto de vista de saúde e de políticas públicas, fazer mais pesquisas para demonstrar os riscos associados à exposição à crisotila é desperdício de recursos... todo tipo de amianto, inclusive a crisotila, tem de ser banido.”
Kathleen Ruff, consultora sênior em Direitos Humanos para o Rideau Institute on International Affairs, disse ser “impensável que universidades canadenses quisessem ter, de alguma forma, seus nomes usados para promover os interesses do lobby do amianto no Brasil e divulgar informações que não correspondem à verdade sobre a fibra comprovadamente cancerígena. A conduta do IBC e da indústria brasileira do amianto de disseminar propagandas enganosas é totalmente imoral”, acusa Kathleen.
Não foi a primeira vez que isto aconteceu. De 1996 a 2000, os mesmos “pesquisadores” Ericson Bagatin, Mário Terra Filho e Luiz Eduardo Nery realizaram a pesquisa “Morbidade e Mortalidade entre Trabalhadores Expostos ao Asbesto na Atividade de Mineração, no período de 1940-1996”. Nessa, foi dito que o estudo teve apoio internacional de uma prestigiada instituição dos Estados Unidos, o NIOSH (Instituto Nacional de Segurança e Saúde Ocupacional, correspondente à nossa Fundacentro).
O médico John E. Parker, professor de Medicina Pulmonar e Cuidados Especiais, representando o NIOSH, desmentiu: “O NIOSH não examinou, nem endossou ou apoiou financeiramente o projeto e o relatório deve ser corrigido...”.
Foi dito que essa pesquisa seria financiada pela FAPESP, que não sabia que mais de 50% dos recursos viriam de empresas interessadas na aprovação do amianto. O médico Paulo Saldiva, professor da FAPESP, assim que soube, se retirou da pesquisa e afirmou: “O amianto é cancerígeno. Eu defendo o banimento total dele no Brasil.”
Assim também, fez Eduardo Algranti, doutor em Saúde Pública, pesquisador e pneumologista da Fundacentro, órgão ligado ao Ministério do Trabalho e Emprego, que ainda, afirmou em entrevista: “Eu participei de um grupo do International Asbesto Removal (IAR), levantando dados brasileiros de mortalidade, e o resultado foi absolutamente vergonhoso... como brasileiro e integrante do grupo, me senti extremamente mal, na medida em que recebi os números referentes à mortalidade por inalação de amianto do Brasil e percebi que parecem números de países em que praticamente não há consumo de asbesto, o que não faz o mínimo sentido... um descaso crônico histórico e de mau gerenciamento de recursos públicos na área de saúde, que vem correndo já há décadas”.
Mais que vergonha, um crime.
A despeito do meio político, em Goiás, o Ministério Público do Trabalho, por intermédio da Procuradoria Regional do Trabalho da 18ª Região, instaurou Inquérito Civil em 14 de setembro último, solicitando a DISSOLUÇÃO do INSTITUTO BRASILEIRO DO CRISOTILA – CRISOTILA BRASIL - OSCIP, “pelas práticas ilícitas que vem perpetrando”.
Impossível descrever, aqui, o conteúdo desta ação, de número 1402-2009-011-18-00-3 em curso na 11ª. Vara do Trabalho, embora valha à pena conhecer os crimes absurdos ali apresentados, na defesa do poderio econômico e político dos defensores da exploração, industrialização e do comércio do amianto.

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

“O Alicerce fundamental de nossa obra é a juventude”Che Guevara

* Artigo publicado no jornal "Diário da Manhã" em 09.09.09

Quem acha que jovem tem que entrar cedo no mercado de trabalho, está, definitivamente, na contramão da história.
Nas próximas linhas, magnífico texto, para reflexão:
Duas Classes Duas Escolas
“Em toda sociedade civilizada existem necessariamente duas classes de pessoas: a que tira sua subsistência da força de seus braços e a que vive da renda de suas propriedades, ou do produto de funções onde o trabalho de espírito prepondera sobre o trabalho manual.
A primeira é a classe operária; a segunda é aquela que eu chamaria de classe erudita. Os homens da classe operária têm desde cedo necessidade do trabalho dos seus filhos. Estas crianças precisam adquirir desde cedo conhecimento e, sobretudo o hábito e a tradição do trabalho penoso a que se destinam. Não podem, portanto, perder tempo nas escolas.
(...) Os filhos da classe erudita, ao contrário, podem dedicar-se a estudar durante muito tempo; têm muita coisa a aprender para alcançar o que se espera deles no futuro. Esses são fatos que não dependem da vontade humana; decorrem necessariamente da própria natureza dos homens e da sociedade; ninguém está em condições de mudá-los. Portanto, trata-se de dados invariáveis dos quais devemos partir.
Concluamos então, que em todo estado bem administrado e no qual se dá a devida atenção a educação dos cidadãos, deve haver dois sistemas completos de instrução que não têm nada em comum entre si ”. Destutt de Tracy (1802)

Segundo a PNAD de 2003, da população economicamente ativa no Brasil:
• 16,6% começou a trabalhar antes de completar 09 anos de idade;
• 59,4% começou a trabalhar com no máximo, 14 anos de idade;
• 81,7% começou a trabalhar com menos de 17 anos.

Alguns questionamentos:
1. Por que o adolescente e o jovem de classes sociais diferentes ainda são tratados com direitos diferentes?
2. Por que tem muito idoso trabalhando desde os oito, dez, doze anos de idade e não tem seus direitos e necessidades básicas garantidas, tendo que trabalhar, às vezes já aposentado, e muitas vezes, em serviços pesados como vender picolé na rua, vigia, varredor de rua etc.?
3. Quem começa a trabalhar mais cedo, se aposenta mais cedo?
4. A pessoa aprendiz entra cedo no mercado de trabalho e convive com toda sorte de gente, no meio de gente boa: estressada, viciada, descrente, abusada... Qual a pedagogia do mercado?
5. É sabido que o mercado ganha, com a colocação de “jovens aprendizes” no mercado, mas ninguém fala em quem paga os resultados deste trabalho precoce: doenças físicas, mentais, emocionais e prejuízos sociais;
6. Será que se a população brasileira tivesse alcançado maiores níveis de escolaridade, entrando no mercado de trabalho com uma formação escolar mais elevada, teríamos hoje um menor contingente populacional abaixo da linha de pobreza?
7. O fato de todos os membros colaborarem na renda familiar e isto não garantir vida realmente digna, pode contribuir com a reprodução da pobreza?
8. O trabalho tende a afastar o/a adolescente da escola e a comprometer seu desenvolvimento social e seus laços afetivos?
9. A presença de adolescentes no mercado, ampliando o exército de reserva e a mão de obra barata, não tira a vaga de muitos adultos, pais/mães de família?
Recentemente, uma Pesquisa elaborada em parceria entre a OIT e a Comissão Econômica para América Latina e Caribe (Cepal) e o com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) constatou que quem começa a trabalhar antes dos 14 anos tem pouca chance de obter rendimentos mensais superiores a R$ 1 mil ao longo da vida; quem entra no mercado antes dos 9 anos tem pouca chance de receber salário maior que R$ 500.
"Em média, quem começou a trabalhar entre 15 e 17 anos não chega aos 30 anos com uma renda muito diferente de quem ingressou com 18 ou 19 anos. Mas, à medida que a pessoa envelhece, há maior probabilidade de que, se começou a trabalhar entre os 18 e 19 anos, consiga melhor renda do que quem começou a trabalhar entre os 15 e 17 anos".
Os avanços conquistados, no campo teórico do entendimento acerca da questão social que envolve a problemática de crianças, adolescentes e juventude, não podem se perder nos achismos de quem só tem compromisso com a conservação do status quo.
Não somos caranguejos.

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Participação e Controle Social na Conferência de Assistência Social

* Publicado no jornal "Diário da Manhã" em 26.08.09

Está acontecendo (25 e 26 de agosto), na Câmara Municipal de Goiânia, a VIII Conferência Municipal de Assistência Social, através do Conselho Municipal de Assistência Social de Goiânia, com apoio da SEMAS – Secretaria Municipal de Assistência Social.
O tema é Participação e Controle Social.
Foram já realizadas, várias pré-conferências pelo Conselho, em várias regiões e unidades de atendimento da SEMAS, tendo na batuta, a profª. Cida Skorupski, Presidenta do Conselho, que muito bem tem falado e se empenhado pela construção do SUAS, Sistema Único de Assistência Social, a partir da Política Nacional de Assistência Social, com diretrizes aprovadas na Reunião Descentralizada, Ampliada e Participativa do CNAS – Conselho Nacional de Assistência Social, realizada em Brasília, em setembro de 2004.
A profª. Cida lembrou-nos, em uma das pré-conferências, que a participação e o controle social são princípios estratégicos de descentralização do Conselho, na deliberação das resoluções da política de Assistência, que é muito diferente do assistencialismo dos primórdios da Assistência Social, calcada na caridade, na solidariedade e na filantropia e realizada para necessitados, chamando a atenção para o fato de que Assistência Social é reconhecida pela Constituição de 1988, como política de direito, para cidadãos, sujeitos de direitos.
Ela falou também, da importância de que usuários, a sociedade em geral, e principalmente, as pessoas trabalhadoras desta política, conheçam o SUAS e a política do município, para a Assistência Social, convocando todos a participarem da Conferência, para uma mesma linguagem, perspectiva e compromisso com o projeto de uma sociedade melhor, reforçando o papel histórico dos trabalhadores sociais na mudança da realidade, e ressaltou que a Assistência Social é a única política que passa por todas as políticas públicas.
Enfatizou o reconhecimento da liberdade e dos direitos civis, sociais e políticos e a “defesa da democracia enquanto socialização da participação política e da riqueza socialmente produzida”, princípios da profissão de Assistente Social.
Mais algumas pérolas da Profª. Cida Skorupski, na pré-conferência:
“Dos trabalhadores da Assistência Social, hoje, exige-se certo nível de formação e informação, não se pode mais agir por conveniência, ao bel prazer, por achismo... dependemos de regras estabelecidas e regulamentadas por leis e quem não as conhece, cria contradições, no trabalho”.
“A Assistência Social hoje, está muito melhor do que já foi, mas é preciso melhorar o salário dos seus trabalhadores, a informatização do trabalho (banco de dados), o fluxo de atendimento e a informação sobre os serviços”.
“A Conferência vai deliberar sobre a realidade atual da política, sobre as prioridades, e o orçamento tem que refletir as prioridades, de acordo com as demandas. É o controle social que tem que verificar se as ações realizadas tiveram resultado positivo e se melhoraram a vida da comunidade atendida”.
“O município de Goiânia tem que articular com os municípios vizinhos, pois têm cidadãos e problemas comuns... como no caso de crianças, jovens e adultos que estão na rua”.
“O trabalho na comunidade, tem caráter preventivo, precisamos ter um diagnóstico da realidade e um sistema de articulação que desenvolva o trabalho em rede”.
Por aí, percebe-se a qualidade e a importância desta Conferência de Assistência Social. Imperdível.
Conferencistas: Dra. Maria do Carmo Brant, professora da PUC/SP e coordenadora do CENPEC; Dra. Eleonora Schetini, professora e pesquisadora da PUC/MG; Dr. Walter Silva, Secretário Municipal de Assistência Social e ainda, representantes do CNAS, do MP, do CMASGyn, da Câmara Municipal e da SEMAS.
Em tempo: nas conferências de Assistência Social, se fazem presentes, pessoas das mais variadas profissões, estudantes, cidadãos e cidadãs comuns.
Todas as pessoas interessadas são sempre bem-vindas e fundamentais, nas discussões acerca da Assistência Social, para que esta política pública aprimore cada vez mais o SUAS, através do emprego de seus princípios: a universalidade, a integralidade, a descentralização, a regionalização, a hierarquização e a participação/controle social.

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

A importância do MST

* Publicado no jornal "Diário da Manhã", em 19.08.09

Segundo João Pedro Stédile, o MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, é um movimento social democrático, que usa o diálogo como expressão, defende a sustentabilidade ambiental e uma reforma agrícola que redistribua a terra, produza alimentos sadios através dos pequenos agricultores e ainda, que desenvolva pequenas agroindústrias nos assentamentos, na forma de cooperativas, para agregar valor aos produtos e gerar empregos no campo.
Tendo surgido no final dos anos 70, o MST incorporou os ideais e a luta das ligas camponesas, apoiado pela Comissão Pastoral da Terra, da igreja católica e pelo Partido dos Trabalhadores. Luta pela terra e pelo debate sobre o modelo agrícola atual do Brasil, propondo uma reforma agrária que favoreça a agroecologia e a pluricultura.
Nos últimos dias, o MST realizou caminhadas, manifestações e ocupações em áreas rurais e urbanas de diversos estados, cobrando do governo federal, o assentamento de 90 mil famílias acampadas há mais de quatro anos Brasil afora, a atualização dos índices de produtividade da terra, inalterados desde 1975 e o descontigenciamento de R$ 800 milhões retidos do orçamento do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), depois do corte de 48% do orçamento aprovado no Congresso, para a reforma agrária.
Os preconceitos e a visão negativa que se tem do MST, denotam a imaturidade política e a manipulação ideológica das classes dominantes em nosso país ainda hoje, com um governo eleito pelas camadas populares, em virtude de um discurso histórico, voltado para a garantia dos direitos humanos e do desenvolvimento sustentável.
Não se pode mais ignorar a função social e econômica da reforma agrária, diante da nova questão social, que se originou de um modelo econômico concentrador de rendas, que traz graves conseqüências a toda a sociedade.
Negar a legitimidade deste movimento de luta por terra para quem nela quer trabalhar e/ou criminalizar esta luta é não querer enxergar as desigualdades entre as pessoas e principalmente, como essas desigualdades se reproduzem na sociedade e na subjetividade humana.
Tive a grata satisfação de estar junto ao MST em alguns poucos momentos, no acampamento em frente ao INCRA e em passeatas. No acampamento, há mais de cinco anos atrás, conheci uma senhorinha que me ofereceu um xarope feito por ela, para tosse, para “uso da casa”. Fiquei surpresa com o poder do remédio e com o carinho da senhorinha e da companheirada ali presente. Encantou-me a organização, a disposição para a luta, o cultivo da cultura camponesa, a seriedade e o compromisso do pessoal. Encontrei ali, jovens, crianças, homens e mulheres, todos imbuídos de alguma mágica esperança, solidários uns aos outros, embora alguns, visivelmente cansados, sob tensão. Alguns mais aguerridos, desconfiados, no primeiro momento. Povo sofrido.
Sempre penso: onde estariam estas pessoas/famílias, se não estivessem neste movimento?
O agronegócio, que expulsa mão-de-obra do campo, adotando a mecanização intensiva, favorece as empresas transnacionais e as exportações e ainda, promove a degradação ambiental através do monocultivo e do uso excessivo de agrotóxicos (de acordo com Stédile, “na safra passada foram jogados 713 milhões de toneladas de veneno sobre o nosso solo, a nossa água e os nossos alimentos”) não incomoda. Mas o MST é considerado criminoso por grande parte da sociedade brasileira, alienada, mal informada, ignorante.
A esta, que muitas vezes pode ampliar seus conhecimentos e sua capacidade crítica, mas tem preguiça, incomoda saber que o MST formou mais de 3.000 filhos de camponeses em cursos superiores e que mais de 3.500 freqüentam universidades e ainda, que mais de 300 fazem pós-graduação, mestrado e doutorado.
Mas é assim mesmo que o MST terá a cada dia, mais sucesso e menos violência em suas lutas. Estudando, dialogando e convencendo, através do sonho em uma sociedade sustentável, com trabalho, educação, moradia e alimento para todos.
Parabéns e sucesso ao MST, na luta por ver e viver a vida digna!
De olho nos fazendeiros coronelistas arcaicos, nos latifúndios, nos banqueiros financiadores do agronegócio, nas empresas transnacionais exploradoras, nos meios de comunicação da elite conservadora, nos políticos representantes do atraso mental e econômico de empreendedores gananciosos e estupidamente alheios à busca de sustentabilidade socioeconômica em nosso país e neste governo, oriundo das lutas sociais, das classes trabalhadoras, de um partido que teve, antes do poder, como uma das maiores bandeiras, a reforma agrária.

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Viva a redução da jornada! Pela redução da jornada!

* Publicado no jornal "Diário da Manhã", em 09.08.09

A PEC 231/95 (Proposta de Emenda à Constituição), que reduz a jornada de trabalho de 44 horas para 40 horas semanais e prevê o aumento do adicional da hora extra de 50% para 75% do valor da hora trabalhada, foi aprovada recentemente na Comissão Especial da Câmara, por unanimidade.
Esta luta é antiga e não para por aqui. Deverá ser aprovada em plenário, ainda neste mês. Lembre-se que estamos em véspera de ano eleitoral.
Nos parágrafos que se seguem, repito trechos do artigo Não somos lírios no campo, aqui publicado no ano passado, e agora, providencial.
O trabalho é atividade vital e não apenas atividade material resultante do desempenho de nossas funções profissionais, para recebimento de salário. É preciso que se leve em conta o que está na mente do trabalhador enquanto produz. Esta relação mental/material é contínua, se reproduz na vida subjetiva e na própria reprodução material que se efetiva. O trabalhador está sempre juntando o que faz intelectualmente, o que produz através do trabalho físico e o que experimenta como pessoa. Não existe o que chamam de mente ociosa, a menos que se atinja o nirvana, que antes de acontecer precisa de trabalho espiritual e muita disciplina. Para Marx, “os homens realizam trabalho, isto é, criam e reproduzem sua existência na prática diária, ao respirar, ao buscar alimento, abrigo, amor etc.”.
Por isto é urgente e necessário estabelecermos um modo de vida que estimule os “hábitos do bom trabalho” para que o homem possa continuamente usar a experiência de seu trabalho em sua vida em reciprocidade. Dialeticamente, o homem não é um ser abstrato, determinado, isolado de situações reais, históricas e presentes, nas quais transcorre sua vida, forma-se sua personalidade e estabelecem-se relações de todos os tipos.
O trabalho modifica não apenas suas condições iniciais objetivas, os trabalhadores mudam com ele, pela emergência de novas qualidades, transformando-se e desenvolvendo-se na produção, adquirindo novas forças, novas concepções e novas necessidades e ainda, se reproduz no seu cotidiano, na sua própria condição de existência, na idéia que o trabalhador tem de si, e no seu relacionamento com outros indivíduos.
O trabalhador não é capacidade de trabalho puramente subjetiva, ele enfrenta as condições objetivas do seu trabalho. Se, em determinada situação, o homem primitivo lutava pela sobrevivência a partir de relações originais e espontâneas com a natureza, as diversas transições e fases pela qual passou, levou-o à separação dessa natureza, em um processo antagônico no qual, na medida em que este homem formou as civilizações, desenvolveu-se nas sociedades um processo de individualização humana e o homem foi se especializando em funções, criando assim, a divisão sexual e posteriormente, social do trabalho.
O que deveria se tornar motivo de cooperação passa a ser a razão da alienação. O trabalhador passa a produzir para outros, o que nem sempre possui e a possuir o que nem sempre produz, passando a viver, não do produto de seu trabalho, mas da venda de si, de sua capacidade, sua força de trabalho em troca do salário.
Às horas e às condições do trabalho, somam-se à realidade do trabalhador o fato de ter que percorrer a cada dia, distâncias maiores em um trânsito caótico e um sistema de transporte coletivo cada vez mais congestionado, devido à expansão urbana. Tudo isto dificulta as atividades familiares, sociais, culturais e de lazer, aumentando os problemas de saúde, como o estresse, a depressão, a hipertensão, as cardiopatias.
Complicado é conciliar as atividades do trabalho e as recomendadas pelos médicos: garantir boa alimentação, bom sono, praticar atividade física regularmente e dispor de condições satisfatórias de lazer...
O enorme alcance social da redução da jornada sem prejuízo dos salários se traduzirá certamente, em melhor qualidade de vida e isto, em elevação de produtividade e de civilidade.
De acordo com o Dieese, a medida vai gerar quase 2,5 milhões de emprego, se mantida a estrutura da produção de hoje. Ressalte-se que a média da duração de trabalho no Brasil, já é inferior ao teto de 44 horas semanais da legislação, devido convenções coletivas, o que minora o risco de impacto significativo para o patronato do país.
Impossível não citar aqui, as palavras de Márcio Pochmann, Economista pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1984) e doutor em Ciência Econômica pela Universidade Estadual de Campinas (1993): “continuamos discutindo as condições de trabalho como herdeiros do capitalismo do século XX”. E ainda, que “é preciso considerar que estamos diante de uma nova possibilidade técnica de organização do trabalho, com jornadas diárias menores e ingresso no mercado de trabalho somente aos 25 anos... Antes, a pessoa deve ser totalmente integrada a uma educação que deve ser recebida ao longo de toda sua vida, diante da complexidade da sociedade contemporânea”.
Concordando com ele, “é claro que essa possibilidade técnica só será possível se houver evidentemente uma concepção de que isso é factível, se houver pressão social e uma articulação política, econômica, social e científica em torno dessa nova questão do trabalho. Não tenho dúvida de que a gente pode marchar para essa sociedade superior”.

domingo, 9 de agosto de 2009

Tia é bom demais

* Publicado no jornal "Diário da Manhã" em 02.08.09

Tantas tias, boas tias, belas tias, todas têm um sentido interessante, profundo, marcante na vida da gente.
Já há muito tempo, pedi que se criasse o Dia das Tias. Ainda não consegui, nem sei por quê... Bufês, bomboniéres, cafés, floriculturas e revistarias teriam trabalho extra, sem dúvidas. Praças, ruas de casas de vós, clubes, restaurantes, bares idem.
Tias são muito importantes. Uma – assistente social, levou-me para ser recreadora na unidade da Vila Redenção, o que foi meu primeiro emprego púbico, com pouco mais de 15 anos, na gestão do então prefeito, Índio do Brasil Artiaga. Há uns oito anos, trabalhei lá novamente e agora estou novamente por perto, onde antes era a FUMDEC.
Tenho uma, também incrível em sua fé, em seu inabalável compromisso com a vida cristã... E ela é de uma alegria e de uma disposição para a vida, que contagia e que encanta como seu lar e tudo q nele há.
Tias lembram a mãe da gente, o pai da gente, a avó da gente, primos e primas da gente. E quase sempre nos dão os tios, também, possivelmente queridos.
Mas as tias, as minhas, têm prendas, têm dons, cada uma se assemelha um pouco com o que vi de minhas avós, em uma ou outra coisa.
Tenho uma, escritora, pinta e borda. Viaja prá cá e prá lá. Mais sistemática e não menos alegre. Apresentou-me (à minha mãe) o Rosa Cruz, a trilogia das três cabalas, do rabino Nilton Bonder. Que ritmo de vida interessantíssimo, que pedaço de família querida, também, nos dá esta tia. Em seus contos, seus encantos, seus mistérios, seus refrigérios.
Um Dia das Tias, valeria para as empresas telefônicas, de transportes.
Faria gente sorrir, chorar de alegria. De tristeza também, saudade, quem sabe.
Tenho uma tia que, nossa, é tia e madrinha e buscava em minha casa as roupas de meu bebê, prá lavar em casa e trazer passada, fraldas de pano, e ele, doente, mas sem descobrir de que infecção intestinal, não se zangou de zelo de minha mãe, avó, de sogra, de mim e das tias.
Tenho tia que preciso visitar, tia q fazia bolo confeitado, de chocolate, rosquinha, carne de porco, couve fininha. Ah, tenho tia, do tempo de minhas avozinhas.
Tenho as festas das tias, a Festa de Santo Antônio, de São João e do Divino.
De aniversário, bom demais, a primaiada.
Não sou tia ideal, mas meus filhos têm muito boas tias, queridas.
Ás minhas, sempre amigas, obrigada.
Tenho um amigo que sai de São Paulo pro interior de Goiás e vai ver suas tias... Uma minha, querida, faleceu prá lá outro dia e eu fui vê-la bem antes, viva.
Viva às tias em almoços, passeios, emails, telegramas. Nossa ainda existe telegrama. Jantares, lanches, piqueniques, sorveterias.
Viva às tias.
Penso sempre em porque se tem prá tudo um dia e nenhum dia é Dia das Tias.

quinta-feira, 30 de julho de 2009

A presença do marxismo na Assistência Social

* Publicado no Jornal "Diário da Manhã", em 27.07.09

O compromisso com a consolidação da cidadania enviesa o Código de Ética dos Assistentes Sociais e aproxima o trabalho social das classes trabalhadoras. A contemporaneidade traz uma diversidade crescente de trabalhadores. Ocupar posição de chefia, desenvolver trabalho intelectual ou técnico e ter bom salário não exclui a condição de trabalhador (a).
A “Opção por um projeto profissional vinculado ao processo de construção de uma nova ordem societária, sem dominação-exploração de classe, etnia e gênero” consta como um dos Princípios Fundamentais do referido Código, bem como a “Defesa do aprofundamento da democracia, enquanto socialização da participação política e da riqueza socialmente produzida”.
Este Código determina um “Posicionamento em favor da equidade e justiça social, que assegure a universalidade de acesso aos bens e serviços relativos aos programas e políticas sociais, bem como sua gestão democrática” e o “Empenho na eliminação de todas as formas de preconceito, incentivando o respeito à diversidade, à participação de grupos socialmente discriminados e a discussão das diferenças”.
A estas orientações, soma-se na Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS, o princípio da “supremacia do atendimento às necessidades sociais sobre as exigências de rentabilidade econômica” e também um de seus objetivos, que é “a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice”.
Enquanto política pública de direito e de direitos, a Assistência Social deve incluir em seu público, todo cidadão que dela precisar, segundo a Constituição de 1988.
Estas colocações são orientações legais e querem dizer que é preciso que se pare de pensar que a Assistência Social é coisa para “pobres”, pois ela não discrimina, embora atue mais ligada às pessoas com maiores vulnerabilidades econômicas.
Mas o Serviço Social sabe que a pobreza não é seu objeto de trabalho. Antes, a organização da classe trabalhadora. E tem caráter participativo. Ele não acha que vai resolver os dilemas para seus usuários, mas com eles. Aí, reconhece a partir da categoria da contradição, os fenômenos sociais a serem trabalhados.
E o Serviço Social sabe também que indivíduos não estão desajustados, mas que a sociedade capitalista traz em seu bojo, a concentração de renda e a conseqüente exclusão, a exploração da mão de obra e a conseqüente dilapidação de direitos humanos e sociais. Busca, então, através da categoria da totalidade, a análise e a compreensão dos fenômenos, para sua atuação.
Sabe que a drogadição e a violência não são causa de desassossego para alguns, mas conseqüência do desassossego de muitos. Que ninguém fica excluído por que quer, porque se pauta no princípio da dignidade humana, da igualdade; não poderia crer que alguns nasceram ruins, perdidos ou “sem jeito”. Nem que tudo isto seja problema espiritual, apenas.
O Serviço Social reconhece a desestruturação familiar enquanto conseqüência de uma sociedade consumista, que fortalece a rivalidade e o egoísmo e causa os problemas sociais da infância, da juventude, da maturidade. Sabe que os problemas destes segmentos não são meramente, questão de polícia.
Com a mediação, outra categoria do marxismo, busca superar a reprodução das situações que emperram a emancipação humana, tendo criado para tanto, o trabalho com grupos e com comunidades.
A busca da transformação social preconizada no Serviço Social, por si, é fruto inconteste do conhecimento marxista, que substituiu os primeiros princípios norteadores desta profissão, pautada inicialmente na religiosidade (caridade) e em seguida, no positivismo.
Na efetivação da política de Assistência Social, se alteram dialeticamente, temas/fenômenos sociais para atuação de assistentes sociais, com demandas nos campos da saúde (obesidade/segurança alimentar, planejamento familiar, drogadição lícita e ilícita, epidemias e pandemias), do trabalho, da segurança e do meio ambiente e articulação nos setores da habitação, da educação, do turismo, de esportes e lazer.
Neste sentido, o caráter de política pública de direitos da Assistência Social coaduna com a música que diz que “a gente não quer só comida”, embora os investimentos na questão social e até o reconhecimento de que ela existe e de que não surgiu do nada, dependam da ideologia do poder hegemônico.

segunda-feira, 20 de julho de 2009

“... Mesmo longe, na saudade, a amizade vai ficando até mais forte..."

* Publicado no Jornal "Diário da Manhã" em 19.07.09

Consta na Folhinha que o Dia Internacional da Amizade é comemorado em 20 de julho. Acompanhar diariamente as datas comemorativas nas pagelas da Folhinha do Sagrado Coração de Jesus, é um hábito prazeroso ao qual me dedico e considero um hobby.
Oriento-me, pelas datas comemorativas. A Folhinha do Sagrado Coração de Jesus, seria outro papo, não fosse a nossa amizade, desde tempos longes, da minha infância, que é desde quando me lembro dela, na casa de meus pais.
A amizade me acompanha sempre em momentos jamais esquecidos que às vezes me atordoam, diante de minhas limitações e fraquezas que intimidam bastante minhas relações. Ofereço pouco, peço perdão, sinceramente por isto.
Às vezes, fico meio que embasbacada com a amizade com que sou acolhida.
O que seria de minha vivência, de meu crescimento, não fosse a amizade que me dedicaram tantas pessoas queridas, desconhecidas, abastadas, desprovidas, que me servem de exemplo, de alento, de sustento, de controle.
Muitas vezes, dói uma saudade de pensar momentos vividos com pessoas as quais me propiciaram o prazer de ouvir, de aprender, que dedicaram amizade à minha pessoa; pessoas das quais pude discordar e com as quais pude falar, sem assustar ou despertar o desejo de conserto ou represália; partilhar experiências de bate-papo, de discordâncias, de silêncio, de medos, de alegrias, de aventuras, de sonhos, de esperanças, de tristezas, decepções. Compartilhar músicas, danças, sabores, dores, paisagens, feriados, trabalhos, situações as mais diversas. Mas é dor de gratidão e de alegria pelas lembranças e sentimentos.
Momentos de amizade. Belos momentos, duros momentos. Muitos, saudosos. “A amizade vem de Deus e a Deus deve levar”.
À amizade de meus pais, na minha vida, glórias! E à de minha irmã e às nossas amizades, todas, louvo a Deus, “pois a amizade é um bem”.
Recebi, na adolescência, um recadinho escrito que “amigo é aquele que nos conhece a fundo e não obstante nos quer bem” e acreditei nisto. Querer bem é ter amizade, independente das imperfeições.
Às vezes, penso em alguém como amigo (a). Em outras, em alguns (as), como pessoa amiga. Com estas, a gente pode até não conviver. Mas recebe e/ou troca amizade. Por palavras, olhares, gestos, na rua, no comércio, no trabalho, em um momento de descontração, na igreja, na pista de dança, de Cooper, no trânsito.
Tenho bons amigos. Muitos momentos de amizade. Encontro muitas pessoas amigas. “A amizade faz cantar o coração”.
Às amizades recentes, imaginárias, antigas, atuais, inativas, às dos amores, de amigos, de meus filhos, de desconhecidos, de parentes e de aderentes, – Viva! A todas elas.
Por mais que eu não diga e que as palavras sejam breves, obrigada aos que me conhecendo a fundo ou não, me querem bem. Que bons momentos tenhamos, juntos ou distantes, de amizade, dia após dia.
E obrigada às pessoas que me tornam capaz de desfrutar do sentimento de ter amizade, que me despertam o bem querer.
Minha humanidade estaria mais comprometida, sem vocês. Com a luta pela sobrevivência, confesso ter esquecido que “eu quero uma casa no campo, onde eu possa guardar meus amigos, meus discos, meus livros e nada mais”. Outro dia, do nada, entrei no carro de uma amiga e logo começou a tocar esta música, e... Poxa, como é corrida esta vida, o que seria sem os momentos de amizade?
Segundo o rabino Nilton Bonder, em seu livro “A Cabala do Dinheiro”, a um rabino muito justo, foi permitido conhecer o paraíso e o inferno. Confuso com a surpresa das imagens, aos poucos foi discernindo uma e outra. Ambas se compunham de uma mesa elegantemente posta para um banquete e pessoas elegantemente vestidas assentadas ao seu redor. Iguarias especiais sem fim, à disposição dos convivas.
Atentando para as imagens, o justo rabino percebeu que as pessoas tinham seus cotovelos virados, o que fazia com que seus braços e mãos fossem voltados para o lado contrário do que temos, normalmente.
Um pouco chocado, atentou-se mais e aos poucos, grande alvoroço foi tomando conta dos dois grupos e o rabino pode observar que no inferno, as pessoas se debatiam mais e começavam a se desesperar e se digladiar, angustiadas com suas condições físicas limitadoras, e o banquete – este se perdia, na confusão.
Cansado, o rabino, ao olhar para o paraíso, pode perceber que aos poucos certa calmaria se instalava naquele ambiente e ele pode ouvir uma música suave, e como que inebriado, ele viu que os braços virados dos convivas fizeram com que uns servissem aos outros, em um ritual de pura magia, em que, além do prazer sentido pelas iguarias trazidas à boca, as pessoas eliminavam angústia cada vez que levavam a comida à boca da outra.
A todos, muita amizade!

Minc e a sociedade do novo milênio

* Publicado no Jornal "Diário da Manhã", em 12.07.09

Por mais que seja complicado tolerar a situação de omissão, cumplicidade e até participação do poder público nas ingerências do mercado no que tange a questões do meio ambiente, o Ministro Minc pode mesmo ter exagerado em suas declarações, ultimamente, sobre ruralistas. Qualquer um pode exagerar, neste campo, me parece.
Mas nunca alguém combateu tão do alto, tão de frente e diante de holofotes de repercussão nacional e até mundial, poderes tão arraigados em nossa terra, mãe gentil explorada, devastada, vilipendiada. O Minc é nosso único ministro com cara de esquerda, além da Dilma, claro.
No decorrer do episódio por ora arrefecido, ao ministro Minc foi atribuído o desejo de “dividir a sociedade em grandes, médios e pequenos produtores”.
Sinto-me muito aliada deste ministro e sentir-me-ia mais desprezada ainda, se não tivesse eu lido As belas Mentiras e já discutido um pouco sobre a apropriação indevida do conhecimento marxista para inculcação ideológica, pelos conservadores.
Ora, como negar a existência de pequenos, médios e grandes produtores? Nesta perspectiva, é bom lembrar que nossa sociedade também se compõe, além de produtores (de gado, alimentos, combustíveis, da indústria, de ciência, de arte etc.), de trabalhadores, de comerciantes, de excluídos. É do sistema capitalista, a divisão social do trabalho – que eu inclusive, acho linda, por remeter a humanidade à interdependência entre suas partes. Isto não é deste governo.
Será já possível discutir as políticas, no campo dos poderes públicos constituídos, da perspectiva da luta de classes, será isto, e a partir do discurso dos ditos ruralistas? Têm a mesma força, estão juntos na mesma luta pequenos, médios e grandes produtores? Difícil imaginar isto.
Mas não é difícil saber que a ira do ministro não pode ser atribuída ao trabalho e ao comportamento de pequenos e médios produtores. Tampouco que são estes que garantem a segurança alimentar no Brasil.
O que ele tem combatido com veemência é uma elite econômica extremamente unida para defender interesses comuns, como a grilagem, que garante os grandes negócios de carvoarias, madeireiras, pecuaristas, produtores de cana de açúcar, de soja, de milho e de monocultivos de madeiras como eucalipto e pinho, todos, agronegócios de exportação, que não seriam problema, não fossem movidos pela cobiça capitalista que comanda a invasão de reservas florestais, por exemplo, mediante ampliação dos seus terrenos através da ocupação da área a ser demarcada e em seguida, legalizada. Á esta elite, até pela sua organização incontestável, ao longo dos séculos, no Brasil, a política sempre garantiu os necessários subsídios agrícolas, as autorizações de uso da terra, e as compras de terras a preços questionáveis. É isto, o que se quer combater, creio.
Muito se noticiou da ofensiva do ministro Minc, mas pouco das cinco horas de suas retratações diante do júri, digo, da Comissão de Agricultura da Câmara, mês passado. É incrível como ficou pobre a discussão, apenas no viés da provocação vingativa, do levante de acusações pessoais, cínicas ou sinistras, insinuosas, inconseqüentes, fora do contexto. No caso, o que se destila, em contrapartida às palavras e ações de Minc pelo Meio Ambiente, são sempre contundências relativas à pessoalidade do ministro. Quanto exagero.
Mas o imaginável acontece e na democracia, com sabedoria, é preciso dizer apenas, humildemente, como fez Minc, na sessão para qual fora convocado, a fim de levar um “passa-fora público”: que não se aceita as injúrias pessoais levantadas, nem as mentiras e falsas interpretações, afinal às vezes, viver não é preciso. Paciência. A caravana passa.
Parabéns, ao Ministro Minc, que a cada dia merece mais, o cargo que ocupa. Continue, junto aos seus, coibindo crimes ambientais, quaisquer que sejam, e esteja certo de que defeitos vários, todos temos. Com vocês ambientalistas, estamos muitos cidadãos comuns.
Neste episódio, esperava eu, mais da liderança ruralista, composta de pessoas da mais alta estirpe, que já devem ter clareza da mudança de tempos, que não são novos, pois há muito temos constatado, dito e ouvido sobre a necessidade da mudança de paradigmas e de comportamentos políticos.
Quão medonho devem ter sido os espetáculos nas arenas em que homens eram jogados aos leões.
É preciso que todos reconheçam logo os atuais e futuros prejuízos socioeconômicos e ambientais previsíveis e mais, que os relacionemos com as arcaicas práticas que temos admitido em nome do mercado capitalista, na busca de uma nova cultura, com novos valores, com vistas à desejada construção da sociedade sustentável que queremos deixar como herança de nossa civilidade.

domingo, 14 de junho de 2009

A Ferrovia Norte-Sul

* Publicado no jornal "Diário da Manhã" em 12.06.09

A construção da Ferrovia Norte-Sul, intensificada no governo Lula, renova esperanças de crescimento econômico nas regiões por onde vai passar e desperta a possibilidade de grandes transformações sociais e culturais, junto aos seus trilhos, que vão interligar as regiões Norte e Nordeste ao Sul e Sudeste do país, por meio de conexões com cinco mil quilômetros de ferrovias privadas.
Esta obra veio em um momento de reflexão sobre os caminhos do mundo e da humanidade e significará muito mais progresso do que o barateamento de até 30% dos custos operacionais no escoamento da produção mineral e agropecuária, devido à redução dos custos com combustíveis e com a manutenção dos veículos de transporte e das rodovias, motivo principal da unanimidade quanto à sua importância, diante do mal estado de conservação das estradas brasileiras.
A chegada das estradas de ferro sempre antecedem períodos de produtividade intensa e de modernização da humanidade. A geração de 17 mil empregos diretos e cerca de 50 mil indiretos, durante sua construção não nos dá a medida da revolução que esta Ferrovia provocará na economia brasileira ao viabilizar novos projetos e impulsionar a produção agropecuária e agro-industrial do cerrado setentrional brasileiro, se refletindo em garantia de mais alimentos não só para brasileiros, pois facilitará as exportações de grãos, carnes, frutas, álcool, biodiesel, minérios e confecções.
Neste cordel de progressos econômicos com integração nacional, também as vidas se transformam, se reconfiguram, diante de novas perspectivas, novas informações que vêm e que vão, novas trocas, não só de mercadorias, mas também de sonhos, de possibilidades, novos encontros, novas oportunidades. Junto à construção das ferrovias, cresce o setor de serviços de saúde e educação, cresce o comércio, surgem bares, restaurantes, hotéis, lojas diversas; amplia-se a arrecadação, ampliam-se mentes.
Nas cidades por onde a Ferrovia Norte Sul passa, é preciso que as prefeituras aproveitem o momento e apresentem ao Estado e ao Governo Federal, um diagnóstico de suas comunidades, as vocações, os entraves.
A Ferrovia, segundo a proposta que consta no site da VALEC, deve trazer consigo o progresso e o compromisso do Governo Lula com as populações mais vulneráveis, identificando, junto às prefeituras e às comunidades, demandas e potencialidades que possam ser trabalhadas a partir do viés da articulação interinstitucional, seja no campo da infra-estrutura, do meio ambiente ou no campo social, de forma a oferecer às populações afetadas, a presença e a ação de um governo que visa não apenas o crescimento econômico, que atende com prioridade a alguns, mas o crescimento sustentável, que considera a vida como foco de toda ação politicamente construída.
A oportunidade ímpar que a construção da Ferrovia Norte Sul oferece, de trabalho a diversas categorias profissionais, agrega certamente, a experiência de muitos profissionais com a juventude de outros tantos; são pessoas de vários municípios e estados do nosso país, que estão aprendendo e se aprofundando, e ainda, percebendo na prática, que com objetividade, seriedade e compromisso coletivo, se vai ao longe, se constrói projetos, obras e um futuro melhor, para si e para a humanidade, em uma troca de saberes e ações intraprofissionais.
A disposição do Governo Lula para com a obra da Ferrovia Norte Sul, vai além da obra em si, preconizando a melhoria da qualidade de vida por onde a Ferrovia passar, fomentando a geração de renda e o comércio nestas comunidades, paralelamente ao estabelecimento de um desenvolvimento comunitário real, a partir de ações em parceria com as prefeituras municipais, a sociedade civil e as várias instituições do Governo Federal que podem e devem ser buscadas para este fim, segundo as normas da VALEC.
Cabe a nós, população, governo em todas as esferas e classe empresarial, acompanhar de perto, compreender, aprovar e garantir o desenvolvimento da Ferrovia Norte-Sul par e passo com o desenvolvimento sócio-econômico sustentável, nas regiões por onde ela passa.
A transparência e a qualidade devem nortear o processo de construção, manutenção e operação da Ferrovia Norte-Sul, uma obra de grandeza física e simbólica que sem dúvidas, vem alterando a rota da nossa história.
A ação do TCU, extremamente necessária, não pode ser de coação da obra, mas de verificação responsável, de exigências coerentes, sem alardes prematuros.
Emperrar esta obra que se arrasta há 26 anos e que nunca parou, na verdade, é onerar ainda mais os cofres públicos.

sábado, 30 de maio de 2009

SOBRE A AUDIÊNCIA DE 21.05

Recebi aqui no blog, comentários interessantes sobre o artigo Os interesses do Estado, os do governo e o amianto, e aproveito este espaço, para comentá-los.
Ao Pablo, que diz que é de “extrema irresponsabilidade a autora deste artigo afirmar que não foi dado espaço às opiniões contrárias ao uso do amianto para se manifestarem na mesa da audiência pública citada” e não me deu tempo suficiente para publicar, no blog, seu comentário, dizendo-me arbitrária, afirmo que não tenho questionado pessoas, mas ações e compromissos, a despeito de qualquer julgo.
Pablo, talvez as falas tenham sido registradas pela AL, em vídeo ou texto, mas não vi nem ouvi mesmo, a oportunidade dada, para contraposições.
E com quem conversei, amistosamente, que estava ao meu lado e fez sua defesa, não me falou da ausência de entidades contrárias ao uso do amianto, que tenham sido convidadas.
Não fico por conta desta questão, nem do blog (infelizmente); gostaria de me dedicar mais a estes pontos. Daí a demora na publicação do comentário... Mas o blog não é público, mesmo, direitos e bons modos a parte...
Não se trata de pesquisa in loco, mais, para mim, que não me contentaria com cartões de visita e momentos solenes, Pablo. E sei bem a posição sindical e de trabalhadores (contrários e a favor), do amianto.
O problema desta luta, não é apenas no conteúdo, mas também na forma.
Aos questionamentos pertinentes do MarceloMF, digo que a região de Minaçú, ao que me parece, seria pródiga para o Turismo, a piscicultura, Marcelo. A ABREA, me parece, tem sugestões importantes no caso da desativação das minas de amianto, quero pesquisar mais sobre este futuro, inevitavelmente próximo.
E o mercado, ao se modernizar, meu querido, se adéqua às novas necessidades, se adapta e absorve, não apenas as novas tecnologias, como os antigos trabalhadores. O arcaísmo é diferente de tradição e nunca foi garantia de eternidade, desenvolvimento. A superação deve ser uma constante para qualquer progresso, e conter um destino seguro e pautado em princípios claros, no caso, a sustentabilidade socioeconômica.
Aproveito para lembrar a finitude do amianto, já que alguns de seus defensores dizem não saber o que será de Minaçú, sem a exploração de amianto. De qualquer modo, terão que pensar uma alternativa. Convém conhecermos a pós-exploração de outras cidades/minas brasileiras.
É fundamental que as instâncias do Poder Público, pertinentes à questão do amianto, se manifestem e clarifiquem os dados e as estatísticas referentes à exploração, reprodução, comercialização, uso e desuso do amianto crisotila. Não só do ponto de vista da quantidade de postos de trabalho/trabalhadores (inclusive a rotatividade), mas também na perspectiva da subnotificação relacionada à questão da saúde pública (nº de casos/tipos de problemas de saúde pulmonar/relação com SUS), do bem ambiental, do cumprimento de leis, da modernização/investimento do setor econômico na busca de alternativas socioeconômicas ambientalmente sustentáveis (relação custo/benefício) e ainda, dos princípios da precaução e da prevenção.

terça-feira, 26 de maio de 2009

Os interesses do Estado, os do governo e o amianto

* Publicado no jornal "Diário da Manhã" em 25.05.09

A audiência pública em defesa do amianto, ocorrida em 21 de maio, na Assembléia Legislativa de Goiás, revelou a enorme discrepância entre o que deve ser, a bem do Estado, e o que vem sendo, para o bem do governo.
Esta confusão é histórica e determina todas as aberrações políticas que temos visto, ouvido e vivido nos últimos tempos, através da democracia e da liberdade de imprensa, que mal mal, vigoram em nosso país.
Digo mal mal, diante do fato de que o Estado é democrático mas não garante o mínimo, ainda, sem oferecer à todos as mesmas condições de acesso aos bens e serviços produzidos coletivamente e o governo sempre possui meios de controlar a comunicação, a educação e a cultura, ideologicamente e economicamente, através do apoio ou do boicote ao que lhe convém.
Quando comecei a escrever sobre a questão do amianto, apenas uma pessoa em nosso Estado, manifestava sua opinião através de artigos convenientes aos interesses do capital direcionado a exploração do amianto, sempre de modo ideologicamente construído, utilizando para tanto, recursos de uma retórica persuasiva, recheada de cinismo e evocando uma legitimidade supostamente digna a esta luta, que há mais de década observo, e apresentando os interesses de um grupo como sendo interesses gerais da sociedade, na tentativa de mobilizar a opinião pública em torno de determinados objetivos, escusos ao desenvolvimento sustentável preconizado nos discursos políticos de hoje em dia.
Nos últimos dias, no entanto, mais pessoas têm-se manifestado a favor da exploração do amianto, em Goiás. E isto é salutar. A produção de amianto vem mostrando a sua cara, em Goiás.
Pessoalmente, não sou contra nem a favor do amianto, mas ávida pela sua discussão, que demorou a chegar a nossa capital. Isto sempre me impressionou pelo que vem sendo posto mundialmente, sobre o amianto, enquanto por aqui sempre se fala de seus méritos econômicos.
E sinto muito, pela forma que chegou e mais ainda, pela última manifestação que vi, de sua discussão.
Ora, a sobreposição de fatores econômicos sobre os ambientais, humanos e sociais, não pode ser de um Estado justo, com um governo seriamente comprometido com o desenvolvimento socioeconômico sustentável e a democracia efetiva.
Estive na audiência aqui mencionada, e não havia sequer uma pessoa na composição da mesa, que pensasse diferente dos que pensam apenas nos méritos do amianto. A mesa não ofereceu espaço para falas, além de si mesma. E embora tenham sido mostradas imagens bem produzidas no aspecto do audiovisual, sobre as fábricas da ETERNIT e as instalações da SAMA, com enfoque em uma “produção limpa e sustentável”, e nada tenha sido contestado, considero deplorável que o nome da engenheira civil e auditora do trabalho em São Paulo, a Sra. Fernanda Giannasi, reconhecida, aclamada e premiada mundialmente como pessoa do bem e de bem, pelos seus estudos e sua luta, tenha sido mencionado tantas vezes, de forma jocosa e pior, como “ludibriadora”, enquanto a SAMA, segundo afirmações ali colocadas, tenha aderido ao Pacto Global.
O asqueroso não é a posição a favor, esta é legítima de seus beneficiados, mas a forma como ela tem se manifestado, ridicularizando o que chama de “oposição”, quer seja a pessoa do Ministro do Meio Ambiente, da Fernanda ou de qualquer “gato pingado” que se coloque nesta “oposição”.
Fui, porque a audiência se denominou pública. Foram feitas ali, indagações sobre dados da “oposição” ao amianto, mas os luxuosos ônibus que transportaram pessoas para a dita “audiência”, e que no fim do dia estavam estacionados em frente a uma churrascaria, apenas continham pessoas “a favor” da exploração do amianto. A inculcação ali estabelecida foi tamanha que acreditam que a SAMA é “empresa modelo para o mundo”, apesar das ações judiciais que respondem, por sonegação de impostos e compras de terras, do Estado, por bagatelas questionáveis. Sequer pensam nas indenizações conquistadas a duras custas, por mais de 2000 trabalhadores do amianto.
Ora, entendo que Minaçú tenha decretado feriado em 16 de abril e que pessoas encheram ônibus para Brasília. Sabemos que a visão de mundo das pessoas reflete-se do modo como exercem a produção e a reprodução de suas vidas. E esta, tem sido cada vez mais imediatista e descartável, mesmo.
O crescimento e a prosperidade das indústrias do amianto, ali colocadas e provavelmente, reais, e que foi atribuída a pessoas com “determinação”, entre “acionistas e colaboradores”, e ainda, à existência de mercado no Brasil, já que os produtos de amianto servem ao numeroso nicho da população, que é de baixa renda, é inquestionável. O questionável aí é o papel do Estado, que não pode mais ser o financiador da acumulação do capital, simplesmente.
O IBC, é público e notório, recebe verba pública e se diz científico. Mas não responde acusações dirigidas ao modus operandis de suas “pesquisas” e de seus pesquisadores, nem orientou a SAMA a procurar médico especializado, para perícias, quando estas eram feitas por médico ginecologista. Científico, mas crente que “não podemos correr o risco de perder este mineral tão importante para o país”.
Ah, o espaço é curto e pouco sei, desta questão do amianto. Mas gostaria de saber mais sobre as considerações da Organização Mundial da Saúde (OMS), da Agência Internacional para a Pesquisa sobre o Câncer (IARC, sigla em inglês), do Instituto Nacional de Saúde e Segurança Ocupacional (NIOSH) dos Estados Unidos, do Instituto Nacional de Saúde e Pesquisa Médica da França (INSERM) e da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) do Brasil e também, as últimas reações da luta, em Pouso Alegre, em Curitiba, em Brasília, em São Paulo e no mundo.
Afinal, não é por estarmos no interior do Brasil, parte mais recentemente desbravada, que não queremos cultura, conhecimento, sustentabilidade e cidadania.

domingo, 17 de maio de 2009

A discussão da maconha e a Macaúba

* Publicado no jornal "Diário da Manhã" em 03.05.09

Sobre a maconha, há muito se fala. Já a Macaúba é pouquíssimo conhecida. Cidadezinha pacata, próxima da capital, como todas as cidadezinhas pequenas, possui internet e participa dos modismos nacionais. Nos interiores goianos, existe um consumo intenso de álcool entre jovens.
Na Macaúba, uma vez por semana, existe uma “diversão para adultos” que combina música, erotismo, álcool e o que mais rolar, em um território, em uma festa, em uma segunda, sem lei.
Maconha ali é besteira.
Outro dia, dois carros voltavam de lá, correndo muito, na madrugada seguinte a um feriado, às 4h30, quando um “acidente” pôs fim à vida de três e feriu cinco pessoas, sendo duas meninas menores de idade. Motoristas embriagados.
Dirigir embriagado, não pode. Mas a festa é conhecida e divulgada na região.
Sobre maconha, a primeira vez que ouvi falar, me martela a cabeça e me faz ver que os equívocos na tentativa de contenção do seu uso são os mesmos.
Não se pode dizer que alguém do mal, ou que vem de fora, estranho e bandido, pode se achegar, seduzir e oferecer maconha ou obrigar ao uso, ou então recomendar cuidado com a fumaça ou ainda, repetir que a maconha provoca a violência, a delinquência ou algo parecido
Mas é preciso urgentemente, uma política que efetivamente incentive e garanta a prática de bons hábitos para a vida com saúde. Que garanta a promoção da educação, da autêntica assistência social.
Sempre defendi o ócio criativo e a ausência dele tem sido cada vez mais causador de problemas. Tanto quanto sempre defendi a diminuição da jornada de trabalho, por saber que o excesso de atividades na luta pela sobrevivência traz a falta de tempo que grassa nas famílias e as condena ao estranhamento de suas partes.
A entrada de jovens no mundo das drogas (lícitas ou não), seja fuga, seja curiosidade, acesso ou o que for, é busca de prazer.
Ausência de lazer, laços familiares frágeis, desequilíbrio emocional?
Pode ser também busca de autoafirmação social, considerando-se que, às vezes, uma pessoa da escola, da comunidade ou do trabalho, curiosamente bacana, da hora, ultra-antenada e pacífica, pode vir a ser, não traficante, mas uma pessoa amiga, que ouve, sorri, chora junto, entende, compartilha a existência, os anseios, os gostos, a maconha.
E depois do acidente, na Macaúba, tudo como dantes.
Na discussão da maconha, também.
Ou quase. Semana passada, ouvi e vi na TV, em um programa de entrevistas, goiano, um representante da polícia dizer que usar maconha, em casa, pode. Pode? Na Macaúba pode.
Pode? E o comércio, como fica?
E as meninas menores? Seus responsáveis serão responsabilizados? As escolas onde estudam e as comunidades onde vivem podem ser responsabilizadas?
Deveriam.
Ouvi uma vez, que durante a guerra, o consumo de maconha e de drogas psicodélicas era permitido pelos EUA, difundido pelo movimento hippie e demais, de contracultura. Isto, para que as multidões de jovens que se rebelavam ficassem “bodados” e confusos com suas drogas, meio que sem atitudes. Se autoanulariam, perderiam o ímpeto, e isto aconteceu.
A discussão atual da maconha está arcaica, preconceituosa, unilateral, limitada, hipócrita.
Só não é inócua, pois tira o tema do armário. Alguns falam contra o consumo abusivo de drogas e incluem aí remedinhos diversos, para dores, calmantes, para emagrecer.
Tem gente achando que “o governo vai liberar drogas”, sem foco na maconha.
O governo deveria ser responsabilizado, em última instância, por consequências graves, devido ao uso abusivo de drogas. São tantas as instituições e os recursos públicos no tratamento de dependentes. E os retornos dos casos, também.
Tratam-se usuários(as) como pessoas com problemas espirituais, mentais, de caráter, mas já se considera que a família também deve ser “tratada”.
E pouco se discute sobre valores, vícios, lazer, cultura, prazer, sistema socioeconômico. Pouco se projeta o futuro. Pouco se garante ainda, do ECA, dos direitos humanos. O atual formato da discussão do uso da maconha, como a realidade da Macaúba, deve ser pensado. Juntamente com as políticas públicas em geral.
Na matéria jornalística, sobre o referido acidente com o pessoal que saía de Macaúba, aparece a Segurança Pública falando sobre o ocorrido.
Nada de família, de escola, de posto de saúde, de comunidade... Nem de proprietário de festa sem lei e com presença de menores.

sábado, 16 de maio de 2009

O amianto, a comunicação e o parlamento

* Publicado no jornal "Diário da Manhã" em 26.04.09

Há pouco menos de 15 anos, quando ouvia o Horário do Brasil, no rádio, ouvi pela primeira vez a voz e a fala, muito bem construída, de Fernanda Giannasi. Ela sempre tem espaço lá.
Já tinha ouvido alguma coisa sobre o amianto e naquele momento aderi ao processo da dúvida, na análise, e ao princípio da exclusão, na síntese, ao pensar este tema.
Têm sido veiculados neste jornal muitos artigos e matérias sobre a atual realidade das lutas em torno do amianto de Minaçu. Até provocamos matéria em outro grande jornal do Estado e também comentários em sites internacionalmente lidos e respeitados.
Esporadicamente, este tema era tratado em artigos nas páginas do DM, de modo a indicar a exploração do amianto como sendo uma atividade positiva para a economia do Estado de Goiás e, principalmente, do município de Minaçu.
Eu, sempre meio que indignada pela unilateralidade do trato do tema, não pude deixar de expressar aqui minha opção pela defesa da luta pelo banimento da exploração do amianto.
Sempre procurei notícias sobre o tema e jamais algum pool me financiou ou exerceu qualquer tipo de pressão sob meus pensamentos e atos (só meus pais) e nunca me admiti ser ideológica.
Por isto respeito o senador Marconi Perillo neste momento de discussão e de definição do rumo desta luta. Seu discurso é digno, eloquente e não desmerece seus opositores. Sempre ousado e atuante, Marconi Perillo propicia ao seu povo goiano a socialização desta luta, quer seja na defesa do banimento do amianto ou em sua condenação definitiva, pois Goiás se evidencia na produção brasileira de exploração, industrialização e comércio de amianto.
Não como respeito e admiro o DM, pelo que significa em termos de socialização de informações e conhecimentos. Nem como respeito e admiro Batista Custódio em sua grandeza/beleza intelectual, espiritual e concreta. E lhe digo que concordo com sua opinião sobre a importância e o retorno de José Dirceu no cenário político e que fui uma das primeiras a manifestar apoio ao Delúbio, contra a hipocrisia e a covardia no meio político.
Por falar nisto, li que o imperador Moulay Ismail, do Marrocos, possuiu 525 filhos e 342 filhas, em 1703. Imagina se todos tivessem direito a passagens aéreas?
Como Batista Custódio é visionário, eu sou, e imagino-o senador por Goiás, como o foi Alfredo Nasser.
O parlamento é pra “parlar” mesmo, e Batista Custódio lá faria isto muito bem, por Goiás! Amo o parlamento, pois ele é arma na luta pela transformação social transparente e democrática.
Sei que Fernanda nunca foi financiada por qualquer grupo econômico. Não está sendo julgada por crimes eleitorais, suas finanças estão declaradas e aprovadas. Sequer se lançou candidata a cargo político. Possui uma vida sem regalos.
Mas Fernanda Giannasi já foi candidata ao Prêmio Nobel da Paz, indicada pelo Greenpace Brasil, como representante “de dignidade, firmeza, compromisso e resistência ativa”. Recebeu, em 2001, junto com o Globo Ecologia e a Brasil Telecom, o Prêmio Pensamento Nacional das Bases Empresariais. Em 2004, Fernanda Giannasi foi homenageada no Japão. Em 2007, a economista brasileiro-palestina Amyra El Khalili, do Movimento de Mulheres pela P@Z! a indicou para o Prêmio Bertha Lutz, em um grito para que Fernanda “trabalhe sem pressões, intimidações, ameaças e acusações infundadas”.
Fernanda é engenheira e auditora-fiscal do Ministério do Trabalho em São Paulo há 21 anos e fundou, legitimamente, a Rede Virtual-Cidadã pelo Banimento do Amianto na América Latina e a Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto (Abrea).
Fernanda Giannasi recebeu homenagens como o Prêmio Cláudia, pelo “reconhecimento de seus relevantes serviços dedicados à preservação da vida”, o Prêmio Cidadã de Destaque do PNBE, Animaseg, Revista Cipa, o prêmio da Associação Americana de Saúde Pública, Ray Sentes no Canadá, além de ter sido eleita como membro vitalício do Collegium Ramazzini na Itália, e das homenagens da Câmara Municipal de Osasco.
Defendo a transparência na política brasileira, a liberdade, a equidade e a fraternidade. Pretendo uma reforma política que inclusive, determine o financiamento público dos partidos e campanhas eleitorais, o que tornaria nossa política menos tendenciosa.
Por isto, ao longo dos últimos anos, observei Fernanda Giannasi e sua luta contra o amianto e aderi a este lado, mas sempre indicando a necessidade da discussão, da pesquisa, da divulgação desta temática.
Sucesso às pesquisas e à audiência pública do amianto. O DM é imenso, mas precisamos sair do papel pra discutir o amianto, as alternativas econômicas sustentáveis para Minaçu, o grupo Saint- Gobain, blogs como o viomundo, ossemmidia, imprensalivre, mercadoetico, chapabranca, as histórias de Fernanda, de Luiz Salvador, de Minc, de Rocha Matos, dos Pinheiro Neto, de David Bernstein, Mário Terra Filho, Ericson Bagatin e Luiz Eduardo Nery, por exemplo, na questão do amianto.
Goiás merece e o mundo agradece.

1º de abril

* Publicado em 30.03.09, no Jornal "Diário da Manhã"

Pensei que seria um dia bem auspicioso para um encontro, digamos, intelectual. Mas, no início, esta data me intrigou,quando foi proposta, até porque passava eu por um período de grande descrença social.
Eu estava mesmo bem apática ao mesmo tempo que preocupada. Sentia-me acuada, sem possibilidade qualquer em vista, desempregada havia quatro meses.
Viver de poesia já não me garantia vitalidade suficiente para ter motivação, mas era o que me segurava. Explico-me: é que havia sido agraciada, naquela época, com a publicação do livro Quimera, de poesias, na Coleção Prosa e Verso, e esse livro me transmite valorosa significação.
Vez ou outra, vendia um livro, surpreendendo alguém e me surpreendendo com a receptividade positiva das pessoas, sensíveis ao tema do sonho, ao estilo poético; as pessoas valorizam a escrita, e poesia tem muito a ver, no coletivo imaginário, com o amor carnal. Poucas pessoas a relacionam com a contemplação, com algo mais universal e abstrato, mas, no geral, senti muitas manifestações de respeito e consideração ao meu poetismo.
Isso me mantinha, mas não me iludia o suficiente para me abster de meus problemas concretos. Sentia-me mesmo muito arrasada pelo desemprego, pelos compromissos e laços desfeitos.
Mas não descri da vida nem de Deus. Vivia mais contida, e a busca interior nos eleva a Deus e se confunde com sinais depressivos, mas me mantinha com uma rotina interessante de cuidados maternos e domésticos, internet, caminhadas diárias, afeto familiar e de pouquíssimos amigos.
Certa misantropia tomara conta de mim, mas intensos sentimentos me mantinham ligada em uma força que me fazia querer superar as limitações às quais eu estava submetida com o desemprego, por não concordar com aquilo para a minha vida, diante da disposição e da dedicação que sempre tive para com o trabalho.
Eis que tive vontade, do limo interior, de oferecer um livro meu ao sr. Batista Custódio.
Eu já havia publicado alguns artigos no DM e, há uma década, envio comentários de leitora. Estive, algumas vezes, na redação. Pensei que ele poderia me receber, afinal eu era uma escritora...
Resolvi procurar diretamente a diretoria-geral e me surpreendeu a delicadeza de Sabrina e a data sugerida: 1º de abril, há um ano. Fiquei intrigada e um pouco ansiosa. Menos que o normal, pois, naqueles dias, evitava, ao máximo, qualquer euforia para evitar a baixa, o descontentamento. Controlava a empolgação, evitava o entusiasmo.
Mas, naquele dia marcado, resolvi ligar para confirmar e confirmei. Não pude conter a insegurança pela roupa a vestir, pelas palavras que usaria. Conhecia Batista Custódio, embora nunca tivesse estado com ele. Sabia de sua simplicidade e excentricidade. De muitos de seus dilemas, suas lutas, algumas paixões e superações, de sua história, sempre tão exposta e sentida.
Não tive dúvidas de que a camisa amarelo-canário e calça jeans com algum salto estariam legal, embora eu estivesse taciturna e quisesse discrição, pois estava muito intimista, aquele amarelo arregalado me lembrou alguma luz, a sabedoria.
Fui para entrar em sua sala, no DM, depois de a Sabrina ter me recebido e pedido gentilmente um livro para que ele desse uma olhadinha, e eu lhe dizer que gostaria de autografar, imaginando já que não seria recebida e satisfeita de apenas encaminhar o livro... Ela me pediu que aguardasse um pouquinho.
Desajeitada, carregando pasta cheia e bolsa, desacostumada do salto e das relações, quando, de súbito, sua sala se abriu, impressionou-me nunca tê-la visto ali... E aquele ambiente me desnorteou um pouco, e o telefone dele tocou, e achei por bem aguardá-lo atender antes de entrar e, quando entrei, ele me recomendou sentar-me e me fez já uma observação positiva e pautada sobre o Quimera, que ele folheava à minha frente.
Qual não foi minha alegria quando percebi o amarelo-canário de sua camisa, que era igual a minha. Olhei ao redor, rapidamente, e estar entre o sr. Batista Custódio e o oratório que fica em sua sala me fez compreender a energia que me maravilhava, entre suas palavras e compromissos inadiáveis e decisões tomadas à minha frente e as pessoas trabalhadoras dali, que entravam e saíam sempre sem importunar ou quebrar o ritmo de nossa conversa, que agradável e extensa, marcou para sempre a minha vida, de modo concreto, mudando meu rumo e me reimprimindo uma dignidade e uma vontade de viver pela minha capacidade de ser feliz e de despertar em alguém tão mais que bacana alguma caridade que me desse atenção, que me ouvisse e perdesse tempo e palavras comigo.
Mas foi uma energia muito imensa mesmo, pleonástica. E intensa, embora tranquila, fluida. Mostrei a ele um livro meu de primário em que eu escrevi que lia e gostava do 5 de Março e seu Café de Esquina e também meus artigos, projetos, falei de mim. Revivi.
Jamais esqueço as palavras, os conselhos e casos que o sr. Batista me revelou e o seu convite para que eu escrevesse semanalmente no DM. Imensurável é a grandeza de Batista Custódio, pois sua obra revela extraordinários alcances e se fez através de sua persistência, coragem, lisura e objetividade, e sua trajetória me encanta também pelo que não é, embora pudesse ter sido, por ter nascido em berço esplêndido e com tanta inteligência, itens capazes de tornar alguém conservador, acomodado, louco ou desiludido ou narcisista, sei lá.
Batista Custódio impressiona, encanta e transmite a segurança de pessoa endurecida, mas que não perdeu a ternura nem o calor das vidas e dos corações inquietos em busca de um sossego que não vem do perecível, do passageiro, mas se concretiza nos encontros da vida, com semelhantes, com a natureza, com o inusitado dos sentidos e dos sentimentos bons.
E por ter anunciado meus serviços sociais nos classificados do DM gratuitamente, vi o anúncio do Sine, que me encaminhou para o emprego no qual estou desde agosto passado.
Parabéns, sr. Batista, e muito obrigada mesmo por tudo, pela sua história e pelo DM!

sábado, 21 de fevereiro de 2009

A mina de Cana Brava em Minaçu está mais para purgatório do que para paraíso terrestre...

Em resposta a artigos publicados recentemente no DM:

Aos convidados para irem conhecer a mina de Cana Brava em Minaçu, eu aconselharia cautela. Não é local de turismo e muito menos um ambiente saudável para quem busca ar puro e descontaminado para encher os pulmões. Dar uma fungada mais profunda, nem pensar!
Os relatos de quem desbravou a bela Serra da Cana Brava - esta sim um paraíso ecológico, se não tivesse as imensas crateras que a voraz produção mineral cravou naquele santuário, são desalentadores. São centenas de famílias atingidas pela poeira devastadora do mineral cancerígeno que causa, entre outras doenças, o pulmão de pedra ou pulmão branco - asbestose, além do câncer de pulmão e o temível mesotelioma.
O que impera naquela região, que foi considerada o Eldorado goiano, é a lei da mordaça ou um silêncio obsequioso imposto pelos detentores do poder - os caciques da cidade. E aí se incluem políticos, donos dos meios de comunicação, sindicalistas, comerciantes. Um pacto de silêncio vergonhoso para que não se conheça a triste realidade com a qual convivem as famílias atingidas pela catástrofe sanitária do século XX.
O convite para que visitem a mina a qualquer hora e dia sem avisar é uma falácia. A tal política das "portas abertas" é algo que só funciona quando os convidados são leigos. Se houver alguém na "comitiva" que entenda minimamente de saúde e meio ambiente, aí começa um drama. Não deixam entrar antes de passarem a noite lavando e lustrando as instalações e modificando o ambiente para o "ilustre visitante".
Eu estive em três oportunidades na mina de Cana Brava, na SAMA em Minaçu. Estive em 3 décadas distintas (80, 90 e agora em pleno terceiro milênio) e pude constatar o avanço da frente de lavra sobre terras agricultáveis já a começar pelo sobrevôo que a cada visita me deixa mais impressionada. O que acontecerá quando o minério se esgotar ? Quem vai tomar conta daquelas crateras? É uma chaga aberta em plena serra e ninguém discute sobre isto.
As vociferações que tentam desqualificar o nosso trabalho por chamar a atenção das autoridades e alertar sobre o que está acontecendo em Minaçu não nos incomoda, muito menos as ameaças veladas e denúncias que institutos propagandistas da fibra cancerígena tentam nos imputar. O que nos preocupa é a falta de conhecimento da população de Goiás sobre o que acontece em Minaçu, manipulada pela desinformação promovida por defensores da fibra assassina, que se locupletam em suas campanhas políticas com fartas doações em dinheiro. Basta entrar em sites como o Transparência Brasil para saber quem é que é financiado pela mineradora e indústrias do amianto neste país da "IM(p)UNIDADE PARLAMENTAR".
Tentar ridicularizar os atos de importantes homens públicos do país, como fizeram com a matéria assinada no jornal DM, sobre a Portaria 43 do Ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, é mais uma das especialidades destes lobistas que pensam que podem iludir o povo com seu jogo de palavras, que incluem ofensas pessoais àqueles que divergem de sua opinião autoritária. O povo não é idiota e sabe muito bem o que está por trás destes ataques travestidos da defesa do interesse do povo de Minaçu. Só adiam o debate, que tem de ocorrer e rápido, antes que seja tarde demais.
O que estes farsantes não dizem, por exemplo, é que o "especialista" que diagnostica os pulmões das pobres vítimas de Minaçu tem residência médica em ginecologia (a nós parece que o buraco que ele investiga é mais embaixo do que deveria!). Cânceres em Minaçu, nem pensar! "Todos são inveterados fumantes", é o que dizem, mesmo que nunca tenha posto um cigarro na boca. Ouvi este relato repetido à exaustão nos encontros em Minaçu com vítimas, viúvas e familiares ávidos para contarem seus dramas pessoais e o descaso em que vivem. Doentes só são reconhecidos e indenizados se tiveram exposição antes de 1980, pois faz parte da máquina propagandística que quem trabalhou após a década de 80 não ficará doente.
Os amiantófilos nunca dizem que quem se expôs a partir de 1980 só terá câncer a partir de 2010.
Afirmar a inexistência de doentes em Minaçu é, no mínimo, uma indecência e um insulto à inteligência humana. Não vivemos mais a época do regime militar onde falar a verdade podia conduzir a morte! As mordaças se romperão e aí veremos quem é que ilude o povo de Minaçu com falsas promessas.
Falam em guerra comercial, como se os produtores de amianto não fizessem parte desta disputa feroz. Por estupidez e visão míope, defendem uma tecnologia obsoleta como é o cimento-amianto, que vem sendo progressivamente substituído por materiais muito mais versáteis (haja vista as caixas d’ água que ninguém mais quer com amianto). Certamente novos concorrentes virão, já que a indústria da reciclagem está sendo uma importante opção para aqueles que querem um material ambientalmente correto e menos perigoso que o amianto!
Esperamos que o amianto seja substituído o mais rapidamente possível e que os políticos de Goiás olhem para Minaçu em busca de alternativas saudáveis e sustentáveis para impulsionar o desenvolvimento da região, ao invés de ficarem enganando a população de lá com promessas mirabolantes de que vão impedir que o amianto seja banido no Brasil.
Esperamos, sinceramente, que Minaçu deixe de ser a cidade das viúvas do amianto e purgatório das vítimas, saindo da era das trevas e se libertando deste pacto de silêncio imposto, com o fim daquele que já foi considerado o mineral mágico e posteriormente se converteu num pesadelo para a sociedade industrial do século XX.


Fernanda Giannasi é Engenheira Civil e Auditora-Fiscal do Ministério do Trabalho e Emprego em São Paulo há 25 anos, onde é Gerente do Projeto Estadual do Amianto.

domingo, 15 de fevereiro de 2009

Acho bacana beber e fumar

* Publicado no Jornal Diário da Manhã" em 06.02.09

Comecei a beber cerveja bem novinha, na “xicrinha”; quase me lembro de como achavam beleza e graça nisto; acho que é por me lembrar de ver um primo bem mais novo que eu também passar por isto.
Aos doze anos, mamãe acendeu um cigarro depois do almoço e disse que queria sentir o que papai sentia; minha irmã e ela não gostaram. Achei interessante, mesmo sem tragar.
E cresci em um lar que continha cerveja, cigarro, cuba libre. Era lindo. Muita valsa, muito bolero, algum tango, Roberto Carlos, MPB, Maysa.
Papai sempre parou depois do trabalho, para tomar uma cerveja; e uma “pinguinha”, quase sempre. Em seguida, direto prá casa. Às vezes, nos buscava antes, para tomarmos um guaraná. Quando não, nos levava o guaraná, o sonho de valsas e a revistinha, com a de modas da mamãe, claro.
Em casa, líamos literatura e jornal diariamente, e pai e mãe garantiram a mim e minha irmã, o privilégio de estudar em excelentes escolas católicas, particulares. Pensavam em nosso futuro, projetavam um mundo melhor, acreditavam na vida e nos repassavam estes valores. Praticamos esportes, dança, convivemos com uma diversidade de culturas, de línguas, de povos. Sem preconceitos.
Agora, papai não bebe mais, mas pode. Não se sente bem quando bebe. Mamãe bebe apenas de vez em quando, como antes, mas apenas um ou dois copos, nada mais.
Ao assistir a mini série Maysa, pude entender meu modo de ser, meus mundos caídos, a paixão sempre contida. Convivo desde sempre, com muita nostalgia. Sou fã de Maysa, e ela me influenciou.
Mas nunca me admiti ser alcoolista ou fumante inveterada. Cada dia tento mais, evitar prejuízos.
Além da “brincadeira” com cerveja e cigarro, papai e mamãe nos ofereceram em nosso lar, muito amor. Aquele amor exigente.
E papai nunca se atrasou para o trabalho, ou “matou” serviço. E a casa de mamãe sempre foi muito organizada, limpa. Papai sempre almoça em casa, na mesma hora, e mamãe sempre o aguarda com a comida à mesa, bonitinha. Ela e a comida.
Diariamente íamos à casa de vovó e tínhamos contato com familiares. Aprendemos, minha irmã e eu, com nossos pais, a respeitar a mesa de refeições, o alimento, e a dar graças a Deus, por tê-lo e por tudo. E sempre tivemos nossas tarefas domésticas.
Como meu pai era assíduo na maçonaria, freqüentávamos muitos eventos beneficentes e mamãe sempre nos levava para passear em instituições filantrópicas. E aprendemos a importância das verdadeiras amizades e também das orações.
Vendo Maysa, na TV, bebendo e fumando aos 15 anos, e todos ao seu redor, percebi o como era comum isto, nos anos 60 e 70. Era chique, moderno. A busca do prazer, a liberdade, a contestação dos padrões da época versus a busca e a inculcação de novos padrões.
Não havia o ECA nem as pesquisas sobre o câncer ou sobre os males do alcoolismo. Parei prá pensar na influência dos poderes econômicos, de comunicação. Nos modismos.
Li uma entrevista com o conceituadíssimo cardiologista de celebridades, o Dr. Bernardino Tranchesi Júnior, onde ele diz que fumar um cigarro após o almoço e outro após o jantar, não faz mal. Gostei da matéria. O médico, elegantérrimo, falava sobre a longevidade, o bem que faz a alimentação equilibrada, uma taça de vinho às refeições, uma caminhada diária e sobre suas próprias vaidades e prazeres: dezenas de roupas e de sapatos de altas grifes, boa comida, bons carros; afirmou fumar cinco cigarros ao dia. Aí, pensei nos índios, que fumam em momentos religiosos e festivos.
Não tenho dúvida de que o problema não é o álcool ou o cigarro, mas as histórias de vida, o desequilíbrio das pessoas, das famílias, a falta de autocontrole, de autoconhecimento. O consumismo desregrado que impede a visão do limite entre “o prazer e a dependência”, o dever e o direito; a inconsciência que coloca em artifícios, em produtos descartáveis, em sensações e em fatores externos, a felicidade.
Comecei a fumar de verdade, aos catorze anos, escondido. Passei muito mal para conseguir. Fumava dois ou três cigarros por dia e há uns cinco anos, deixei de conseguir, pois me sentia mal. Se me perguntavam se tinha parado, dizia que não, apenas não conseguia mais. Aí, há uns quatro meses, voltei. Fumei uma carteira em um mês e não quis mais, mas não me senti mal. Não gosto do cheiro do cigarro, que fica, e não tenho sentido vontade de fumar.
Costumo dizer que gosto muito de beber pouco. Não tenho compromisso com o álcool, nem mesmo em fins de semana. Gosto de beber uma latinha, às vezes duas, quase sempre, em casa. Não gosto de perder o meu controle, de passar mal.
Gosto de bares, de boates, de festas, de bate-papo, de danças. Mas nada disso faz parte do meu ritmo, do meu habitué. Gosto muito de gente, de amizades, mas tenho várias razões para gostar de estar em casa também, e da minha companhia.