domingo, 15 de fevereiro de 2009

Acho bacana beber e fumar

* Publicado no Jornal Diário da Manhã" em 06.02.09

Comecei a beber cerveja bem novinha, na “xicrinha”; quase me lembro de como achavam beleza e graça nisto; acho que é por me lembrar de ver um primo bem mais novo que eu também passar por isto.
Aos doze anos, mamãe acendeu um cigarro depois do almoço e disse que queria sentir o que papai sentia; minha irmã e ela não gostaram. Achei interessante, mesmo sem tragar.
E cresci em um lar que continha cerveja, cigarro, cuba libre. Era lindo. Muita valsa, muito bolero, algum tango, Roberto Carlos, MPB, Maysa.
Papai sempre parou depois do trabalho, para tomar uma cerveja; e uma “pinguinha”, quase sempre. Em seguida, direto prá casa. Às vezes, nos buscava antes, para tomarmos um guaraná. Quando não, nos levava o guaraná, o sonho de valsas e a revistinha, com a de modas da mamãe, claro.
Em casa, líamos literatura e jornal diariamente, e pai e mãe garantiram a mim e minha irmã, o privilégio de estudar em excelentes escolas católicas, particulares. Pensavam em nosso futuro, projetavam um mundo melhor, acreditavam na vida e nos repassavam estes valores. Praticamos esportes, dança, convivemos com uma diversidade de culturas, de línguas, de povos. Sem preconceitos.
Agora, papai não bebe mais, mas pode. Não se sente bem quando bebe. Mamãe bebe apenas de vez em quando, como antes, mas apenas um ou dois copos, nada mais.
Ao assistir a mini série Maysa, pude entender meu modo de ser, meus mundos caídos, a paixão sempre contida. Convivo desde sempre, com muita nostalgia. Sou fã de Maysa, e ela me influenciou.
Mas nunca me admiti ser alcoolista ou fumante inveterada. Cada dia tento mais, evitar prejuízos.
Além da “brincadeira” com cerveja e cigarro, papai e mamãe nos ofereceram em nosso lar, muito amor. Aquele amor exigente.
E papai nunca se atrasou para o trabalho, ou “matou” serviço. E a casa de mamãe sempre foi muito organizada, limpa. Papai sempre almoça em casa, na mesma hora, e mamãe sempre o aguarda com a comida à mesa, bonitinha. Ela e a comida.
Diariamente íamos à casa de vovó e tínhamos contato com familiares. Aprendemos, minha irmã e eu, com nossos pais, a respeitar a mesa de refeições, o alimento, e a dar graças a Deus, por tê-lo e por tudo. E sempre tivemos nossas tarefas domésticas.
Como meu pai era assíduo na maçonaria, freqüentávamos muitos eventos beneficentes e mamãe sempre nos levava para passear em instituições filantrópicas. E aprendemos a importância das verdadeiras amizades e também das orações.
Vendo Maysa, na TV, bebendo e fumando aos 15 anos, e todos ao seu redor, percebi o como era comum isto, nos anos 60 e 70. Era chique, moderno. A busca do prazer, a liberdade, a contestação dos padrões da época versus a busca e a inculcação de novos padrões.
Não havia o ECA nem as pesquisas sobre o câncer ou sobre os males do alcoolismo. Parei prá pensar na influência dos poderes econômicos, de comunicação. Nos modismos.
Li uma entrevista com o conceituadíssimo cardiologista de celebridades, o Dr. Bernardino Tranchesi Júnior, onde ele diz que fumar um cigarro após o almoço e outro após o jantar, não faz mal. Gostei da matéria. O médico, elegantérrimo, falava sobre a longevidade, o bem que faz a alimentação equilibrada, uma taça de vinho às refeições, uma caminhada diária e sobre suas próprias vaidades e prazeres: dezenas de roupas e de sapatos de altas grifes, boa comida, bons carros; afirmou fumar cinco cigarros ao dia. Aí, pensei nos índios, que fumam em momentos religiosos e festivos.
Não tenho dúvida de que o problema não é o álcool ou o cigarro, mas as histórias de vida, o desequilíbrio das pessoas, das famílias, a falta de autocontrole, de autoconhecimento. O consumismo desregrado que impede a visão do limite entre “o prazer e a dependência”, o dever e o direito; a inconsciência que coloca em artifícios, em produtos descartáveis, em sensações e em fatores externos, a felicidade.
Comecei a fumar de verdade, aos catorze anos, escondido. Passei muito mal para conseguir. Fumava dois ou três cigarros por dia e há uns cinco anos, deixei de conseguir, pois me sentia mal. Se me perguntavam se tinha parado, dizia que não, apenas não conseguia mais. Aí, há uns quatro meses, voltei. Fumei uma carteira em um mês e não quis mais, mas não me senti mal. Não gosto do cheiro do cigarro, que fica, e não tenho sentido vontade de fumar.
Costumo dizer que gosto muito de beber pouco. Não tenho compromisso com o álcool, nem mesmo em fins de semana. Gosto de beber uma latinha, às vezes duas, quase sempre, em casa. Não gosto de perder o meu controle, de passar mal.
Gosto de bares, de boates, de festas, de bate-papo, de danças. Mas nada disso faz parte do meu ritmo, do meu habitué. Gosto muito de gente, de amizades, mas tenho várias razões para gostar de estar em casa também, e da minha companhia.

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