quarta-feira, 23 de abril de 2008

TRABALHO E SOCIEDADE

* Publicado no Jornal "O Popular", em 08.10.2003

As mudanças que se fazem necessárias no atual contexto socioeconômico em que vivemos só se farão no momento em que percebemos realmente que a construção de uma nova sociedade é o que justifica o atual governo do Brasil.

É preciso novamente refletirmos sobre a conjuntura, identificando o que tem de mudar, pois apesar de querermos diferenças, pensamos com os mesmos referenciais de sociedade que alicerçaram a sociedade capitalista.

Senão vejamos: a obsessão por acabarmos com o desemprego tem nos levado a buscar, ensandecidamente, encaminhar pessoas para o mercado de trabalho. Esta era a lógica dos governos conservadores de antes. E, mais anteriormente, vale lembrar, a ideologia dominante apregoou que o trabalho dignifica o homem. Isto é verdade; sem dúvida o trabalho é a força motriz de nossa civilização. E não apenas o trabalho físico, mas não é apenas o trabalho que dignifica o homem...

O fato é que a mesma ideologia que disseminou a idéia de que “o trabalho dignifica o homem” não contribuiu para que, efetivamente, cotidianamente, o homem trabalhador exercesse, exercitasse a sua dignidade. Como sabemos, o mercado de trabalho nos mostra a dicotimização entre o pensar e o fazer do trabalho. Mostra também a criação da mais-valia e a alienação do trabalhador no que se refere aos instrumentos, às condições e ao desfrute do resultado do seu trabalho.

Ora, ou a gente começa a inverter a lógica do mercado atual e pára de alimentar o sistema, ou cada vez mais teremos de acudir as perversões que ele provoca.

A obsessão por conseguir ampliar a oferta de emprego em nosso País, nos tira do horizonte o viés que orientou o PT em sua gênese, que é a reformulação das relações sociais e de produção, com vistas a uma sociedade justa, fraterna e democrática.

Temos, neste caminhar, esbarrado em vários obstáculos econômicos, políticos, administrativos, culturais. Mas sem dúvidas, o poder das idéias antigas é o maior obstáculo que temos tido. Queremos um mundo novo, mas acreditamos nas mesmas regras de antes. Há muito percebemos que o mercado é excludente, explorador e dezumanizante. E, no entanto, abrimos cursos profissionalizantes para jovens, e os “ajudamos” a dividir seu tempo entre o trabalho e a escola. No entanto, sabemos que a queda no rendimento e a evasão escolar se dão, em muito, devido à dupla jornada, aliada a outros fatores econômicos e sociais que não se resolvem com a entrada do jovem adolescente no mercado, para ampliar a oferta de mão-de-obra barata e a competição entre as pessoas.

Às vezes, ouvimos alguém dizer que, antigamente, menino era na roça, na lida; que menino não tinha tempo para vadiagem. Sem refletir que estes eram os filhos dos trabalhadores. Os dos empregadores iam para as capitais, se formarem. E a história se repete, garantindo a reprodução da classe trabalhadora.

E sobre as escolas de tempo integral? Sabemos do estresse na infância e na juventude e muito falamos que as famílias não têm tido “controle” sobre os filhos. E as mães, estão no mercado de trabalho, junto aos pais e, ainda assim, sem um salário justo, sem salário honesto. Aqui, uma indagação: temos tido filhos para formar família, ou para serem educados pelo Estado e pela sociedade, a fim de servirem ao mercado?

Precisamos falar sobre a importância do lar, do planejamento familiar, dos almoços diários e de domingo, em família.

A juventude precisa de perspectivas melhores do que se profissionalizar, ser marceneiro, jardineiro, confeiteiro, mecânico.

Precisamos despertar e perceber que a busca de conhecimento é inerente ao ser humano e que não devemos ser tão pragmáticos ao ponto de querermos da vida apenas conseguir um bom emprego. Mas querer uma vida que tenha o sentido de progresso, em um sistema que fomente a igualdade de oportunidade e a universalização de direitos para todos os cidadãos.

Querer um trabalho que produza condições dignas de existência e garanta uma aposentadoria decente, será sempre utopia e letra de música, ou o momento é agora?

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